O sentido de uma letra de canção vai-se actualizando conforme os tempos. Quando compus o Dancemos no mundo, falava dos casais separados por barreiras rácicas, políticas, religiosas, ideológicas. E o seu desejo continuado de poderem simplesmente dançar juntos, neste mundo que é só um (diz-se…). Esse desejo está agora coartado por esta nova e tremenda ameaça. Mas continua a ser um desiderato actual, legítimo, e mais – premente. Que um destes dias (quando?) possamos dançar livremente neste muito mundo que, quer se queira quer não, continua a ser só um.
Isto é como tudo
não há-de ser nada
a minha namorada é tudo que eu queira
mas vive para lá da fronteira
Separam-nos cordas
separam-nos credos
e creio que medos e creio que leis
nos colam à pele papéis
Tratados, acordos são pântanos, lodos
Pisemos a pista é bom que se insista dancemos no mundo
Eu só queria dançar contigo sem corpo visível
dançar como amigo se fosse possível
dois pares de sapatos levantando o pó
dançar como amigo só
Por ódio passado (que seja maldito)
amor favorito não tem importância
se for é de circunstância
Separam-nos crimes
separam-nos cores
a noite é de horrores quem disse que é lindo
o sol-posto de um dia findo
Sozinho adormeço
E em teu corpo apareço
Pisemos a pista
é bom que se insista
dancemos no mundo
Eu só queria dançar contigo
sem corpo visível
dançar como amigo
se fosse possível
dois pares de sapatos
levantando o pó
dançar como amigo só
Em passos tão simples
trocar endereços num mundo de acessos
ar onde sufocas
lugar de supostas trocas
Separam-nos facas
separam-nos fatwas
pai-nossos e datas
e excomunhões acondicionando paixões
Acenda-se a tua luz na minha rua
Pisemos a pista
é bom que se insista
dancemos no mundo
Eu só queria dançar contigo
sem corpo visível
dançar como amigo
se fosse possível
dois pares de sapatos
levantando o pó
dançar como amigo só