Carlos Martins (músico, compositor)

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Carlos Martins (músico, compositor)

107ª Recolha de Entrevista

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Nasceu no Alentejo, numa aldeia chamada Etiópia, no ano de 1961. É  um dos mais activos e consolidados músicos em Portugal.


Saxofonista, compositor e formador conta nesta recolha maior, da qual se disponibiliza uma parte no acervo deste projecto online, que começou por tocar percussões na rua em criança e que o ensino da música de modo 'oficial' é encetado na Banda Filarmónica de Grândola, onde estudaria clarinete, música e teoria musical.

O ambiente em que aprendeu música (a importância, entre outros, da perseverança do maestro Jorge Picoito para a sua aprendizagem de música) no Alentejo foi, como recorda, de um valor inestimável, mas o quadro social, cultural e ideológico em que cresce revelaram-se de igual importância. É neste campo que Carlos Martins fala dos desejos, ânsias e angústias que se viviam nesse período:  a suposição, utopia e  desejo de liberdade, a vontade e curiosidade do 25 de Abril de 1974, o incentivo à leitura de Karl Marx e Friedrich Engels, o estudo e a reflexão de disciplinas como a filosofia, as relações de proximidade e ambiente colaborativo, o lado afectivo e um sentido de transformação e idealismos fora do que apelida de 'determinismo revolucionário',  mas que convivia com o lado mais impenetrável do poder local partidário de esquerda. Foi líder dos estudantes comunistas, integrou um grupo de baile tendo como ideia inicial tocar bateria, o Conjunto Inovação, mas rapidamente passaria para os saxofone alto, emprestado para o efeito, e clarinete, onde chegou a tocar repertório do caboverdiano Luís Morais. Neste contexto, intuitivamente,  arriscaria as primeiras improvisações, sem saber exactamente que o fazia. 


Lembra ainda que com 19 anos, já em Lisboa, tocava com um conjunto alargado de músicos oriundos de Cabo Verde, vendo aí uma possibilidade de ficar  a tocar até tarde, desenvolvendo as suas capacidades interpretativas.

Os papéis assumidos, no seu crescimento como músico e indivíduo participativo na sociedade, que a sua passagem, de cerca de ano e meio, pela Banda da GNR, destacando os músicos de vários instrumentos de sopro que dali saíram e integravam neste período orquestras clássicas reconhecidas, ou pela Orquestra de Jazz do Hot Clube, com a facilidade que já tinha ganho em ler música - elemento decisivo para a sua integração -, os livros de solfejo que se estudavam na banda, são fundamentais e também por isso aflorados nesta conversa. Viria a juntar à sua formação os estudos realizados na Escola de Música do Conservatório Nacional.


Diz que se apercebeu nestes anos que é o ritmo que «faz a diferença da música entre os mundos», o ritmo inclusivé da voz em vários domínios musicais, dando de igual forma na fundamentação desta sua ideia o Fado (cantar Fado) como exemplo.


O racismo durante a década de 1990 na cidade de Lisboa, a criação da  Orquestra Sons da Lusofonia, Lisboa Capital da Cultura no ano de 1994, que teve Ruben de Carvalho como programador da área musical, e as primeiras tentativas de incentivo à organização de encontros e sessões, tendo a prática musical como motor, de fomento à reunião das diversidades de credos, espaços de origem, línguas e etnias, a entrada na UE,  são outros aspectos que enformam temporo-espacialmente o seu percurso e também por isso abordados e reflectidos nesta conversa.


Fez parte da Escola de Jazz do Hot Clube de Portugal, da Academia de Música de Setúbal, da New Jersey Performing Arts Center e foi responsável pela fundação do Quinteto de Maria João, do Quarteto de Jazz de Lisboa e do Sexteto de Jazz de Lisboa.

Trabalhou e gravou com músicos  como Cindy Blackman, Ralph Peterson Jr., John Stubblefield, Don Pullen e Bill Goodwin,  com o Grupo Colectiva (Teatro e Música) colaboraria com a compositora Constança Capdeville, actuou em vários concertos da Oficina Musical do Porto, dirigida pelo maestro Álvaro Salazar, bem como com os músicos solistas do Teatro Nacional de São Carlos, dirigidos pelo maestro João Paulo Santos. Tais actividades marcam indelevelmente o seu caminho como músico.


Em 1992 fundou o Festival Lisboa em Jazz, que deu origem à Festa do Jazz  que dura, até à data em que é realizada esta recolha, há 13 anos, o primeiro festival dedicado à apresentação de músicos portugueses de jazz, organizado em Portugal.

É presidente há 20 anos da Associação Sons da Lusofonia e foi nesta condição que iniciou há 10 anos o Lisboa Mistura, dirigindo-o até ao presente.


Escreveu música para teatro, cinema e bailado, tendo colaborado com o coreógrafo Rui Horta, ou com a bailarina e coreógrafa Vera Mantero. No cinema fez a banda sonora do filme "Filha da Mãe" de João Canijo, a banda sonora e a música da exposição "A Queda de um Anjo" do escultor António Quina e bandas sonoras do filme ‘PAX’ de Eduardo Guedes (1994) e do vídeo "Sétima Colina", de Lisboa 94.

Perspectivas e Reflexões no Campo
Fotografias: Helena Silva
Recolha efectuada em LARGO Residências, Lisboa

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«memoriamedia» e-Museu. O que é?

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«memoriamedia» e-Museu. O que é?

MemoriaMedia  é um Portal online que congrega nele um grupo de investigadores, de ligações a trabalhos nos campos audiovisual, informativo, investigativo, arquivístico numa rede complementar de partilha de interesses comuns.

José Barbieri (director, realizador e responsável pelos meios multimédia) apresenta-nos um Museu Público que junta o campo da comunicação e da imagem com o da investigação: partilha vídeos, documentários e estudos sobre manifestações culturais do património cultural imaterial – expressões orais, saberes, celebrações e práticas performativas. A plataforma está organizada segundo critérios baseados nas recomendações da UNESCO e na legislação nacional para inventariação do Património Cultural Imaterial. O projecto agregador pretende valorizar quer as diversas comunidades  como o diálogo intercultural.

Pode navegar livremente, partilhar todos os vídeos, baixar documentos e arquivos sonoros. Os conteúdos estão organizados em secções. 

Pode, para melhor se inteirar, visitá-lo aqui 

Referência ao Mural Sonoro entre outros Projectos de Investigação, aqui

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Sérgio Godinho (músico e escritor)

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Sérgio Godinho (músico e escritor)

106ª Recolha de Entrevista
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Nesta recolha explica a importância das suas viagens, o que daí recolheu do ponto de vista cultural no geral e literário e musical em particular, da fase do exílio em França e dos espaços onde tocava nesse período, mas também reflecte sobre temáticas como o uso de conotações datadas no âmbito da recepção musical e/ou dos mass media , como sejam o desígnio «música de intervenção» bem como acerca de  algumas das características patentes no seu legado discográfico, nas opções que tomou e no seu repertório, explicando, entre outros aspectos, que parte sempre de uma estrutura musical quando compõe surgindo a letra ou o poema já depois nesse processo, passando pelo repertório pensado e produzido para as crianças mas que não se confina apenas a essa faixa etária (exemplificando porquê), foca ainda de que modo inscreve a sua performance em espaços distintos: o estúdio de gravação e o espectáculo ao vivo e a importância dos músicos que o acompanham nessa acção.

Ao longo do seu percurso Sérgio Godinho escreveu para outros intérpretes e compositores de destaque na sociedade portuguesa, e também alude às circunstâncias em que tal acontece no decorrer desta conversa, a sua música serviu outros domínios culturais e artísticos como o cinema, a televisão, o teatro, tendo também participado  em alguns deles quer como intérprete como realizador/dramaturgo.

A sua vivência do Maio de 68 em Paris, a participação na produção francesa do musical "Hair", onde se manteria por dois anos, bem como as suas primeiras composições, muitas ainda em francês, acabariam por ajudar aos primeiros contactos daquele que viria a ser o seu caminho  no seio da música e cultura populares.
O seu papel na escrita de canções começa a tomar forma no ano de 1971 quando participa no fonograma que marca a  estreia a solo de José Mário Branco, "Mudam-se os Tempos Mudam-se as Vontades" como explica ao longo deste registo, sendo autor de quatro das letras d este disco (colaboraria também como letrista no disco de José Mário Branco "Margem de Certa Maneira" do ano seguinte, editado em França).


Perspectivas e Reflexões no Campo
Fotografias: Alexandre Nobre
Recolha realizada em Lisboa na casa de Sérgio Godinho

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Alexandre Frazão (músico/baterista, autor, formador)

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Alexandre Frazão (músico/baterista, autor, formador)

105ª Recolha de Entrevista
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BI: Alexandre Frazão é um músico e compositor brasileiro que conta já com trinta e três anos de actividade na Música Popular.
Natural de Niteroi acompanharia a imigração dos, acabando por se radicar desde 1987, tinha dezanove anos de idade, na cidade de Lisboa.

Nesta recolha explica de que modo se liga à bateria, e a importância dos primeiros agrupamentos de garagem no domínio do 'pop-rock', ainda em Niterói, que integrou e onde acabaria por dar os primeiros passos como baterista, ou o primeiro Rock in Rio, ano de 1985, no Rio de Janeiro, Festival que pelo cartaz da altura reforçaria ainda mais o seu gosto por música. Reflecte ainda sobre a sua chegada a Portugal e os músicos com quem acabaria por intersectar os primeiros diálogos musicais, especialmente no domínio do 'jazz', através do Hot Clube de Portugal, como, entre outros, Mário Delgado ou Bernardo Sassetti e o naipe de músicos e compositores de outros domínios musicais com quem acaba, ao longo do seu caminho como músico, por colaborar quer na gravação de  fonogramas como em espectáculos ao vivo como: Luís Pedro Fonseca e Lena D'Água, Mafalda Veiga, Júlio Pereira, Pedro Abrunhosa, o projecto Resistência, Rui Veloso, Ala dos Namorados, Nuno Rebelo, Rão Kyao,  Tim Tim por Tim Tum (onde as baterias têm o lugar de protagonista), Jim Black, entre tantos outros.

Alexandre Frazão reflecte, entre outros assuntos, nesta conversa sobre o modo como vê as mudanças estruturais do ensino da música em Portugal e o papel do computador e do disco nessa aprendizagem, nas novas plataformas de armazenamento e reprodução do som e da música, na forma como compõe em cada contexto para o qual é chamado, ou que o tem como autor, e nas transformações que se patenteiam ao longo do seu percurso neste campo, muito por causa dos vários domínios que abraçou (tanto como intérprete como autor).

Juntou a Tuba e Guitarra à Bateria em 1994 e gravaria, já nos anos 2000, o disco com o mesmo nome com os músicos Mário Delgado (guitarra) e Sérgio Carolino (tuba), com quem fundou o Trio TGB, do qual também fala, expressando algumas características na produção do repertório para este grupo, entre outros aspectos, neste registo de conversa.

Com os vários agrupamentos que integrou ou integra tem actuado quer em Portugal como em países como  França, Alemanha, Espanha, Brasil, China, Bélgica, Dinamarca e participado em vários festivais, como por exemplo, Jazz em Agosto, Festival Europeu do Porto, Jazz em Serralves ou Festival Internacional de Macau.

Do seu percurso faz também parte o grupo Led On, grupo que reúne músicos de outros agrupamentos musicais para um tributo ao grupo Led Zeppelin.

No seu legado fonográfico, acerca do qual também acede a um conjunto de questões que o norteiam, contam-se discos de outros músicos, como já referenciado, como em exemplo: “Nocturno” de Bernardo Sassetti, “Filactera” de Mário Delgado, “Undercovers” de Maria João e Mário Laginha, “Tempo” de Pedro Abrunhosa, os DVDs de Rui Veloso, “O Concerto Acústico”, e Ala dos Namorados ou “Ao Vivo no S. Luiz”. 

Destacam-se na sua obra as seguintes edições:
Ascent - Bernardo Sassetti Trio2 - (Clean Feed, 2005)
Terranova - Afonso Pais – (Clean Feed, 2004)
A Luz - Laurent Filipe – (Clean Feed, 2004)
Tribology - Rodrigo Gonçalves – (Capella, 2004)
TubaGuitarra&Bateria - TGB – (Clean Feed, 2004)
Nocturno - Bernardo Sassetti – (Clean Feed, 2002)
Filactera - Mário Delgado – (Clean Feed, 2002)
Sempre - Carlos Martins – (EMI/VC, 1999)
Diálogos de Bateria - Tim Tim por Tim Tum – (BMG, 1997)

© 2015 Alexandre Frazão à conversa com Soraia Simões, Perspectivas e Reflexões no Campo
Pesquisa, Som, Edição, Texto: Soraia Simões
Fotografias: Alexandre Nobre
Recolha realizada em LARGO Residências

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Yami Aloelela (músico, autor, compositor)

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Yami Aloelela (músico, autor, compositor)

104ª Recolha de Entrevista
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BI: Yami Aloelela é um músico e compositor angolano. Nascido no ano de 1969 conta já com cerca de 30 anos de experiência como músico, vinte e cinco como músico profissional.
Conta nesta recolha de entrevista a importância que no seu caminho assumiram o Hot Clube de Portugal, como escola/instituição, as colaborações ou participações nos Festivais RTP da Canção a acompanhar intérpretes como Anabela ou Adelaide Ferreira, que lhe permitiram desde os 20 anos de idade viver da actividade musical, do trabalho que nos anos de 1990 se foi intensificando com vários músicos de origem cabo-verdiana radicados em Lisboa e que o incentivaria a reencontrar, também, as suas raízes e a traçar, anos mais tarde, o seu percurso a solo, não esquecendo ainda os que acompanhou e acompanha, sobretudo através do baixo, seu instrumento de eleição, mas também da voz e que foram uma espécie de segunda escola, como Mariza, Carlos do Carmo, Sara Tavares, Paulo de Carvalho, Demis Roussos, Ivan Lins, Anna Maria Jopek, Rhani Krija, Paulino Vieira, Celina Pereira,Tito Paris, Bana, entre outros. 
Yami é filho de um minhoto e de uma africana, originária da região interior de Angola, nasceu em Luanda e reflecte que quando assume o seu percurso a solo assume também o seu espaço de origem e as várias facetas culturais no geral, musicais e linguísticas em particular, que ele encerra como, a título de exemplo: a fonética ou musicalidade do quimbundo. Neste registo sonoro expressa de igual modo a sua posição perante o crescimento e desenvolvimento das novas tecnologias de informação, mas também de produção do som e da música e a lei da cópia privada, entre outros tópicos.
Acrescenta ao seu legado fonográfico, nos vários discos em que colaborou de outros músicos, o seu trabalho em nome próprio, sendo o primeiro editado no ano de 2007. «Beijo de Luz» marca o seu segundo registo solo.

© 2015 Yami Aloelela à conversa com Soraia Simões, Perspectivas e Reflexões no Campo
Pesquisa, Som, Edição, Texto: Soraia Simões
Fotografias: Alexandre Nobre
Recolha efectuada em LARGO Residências

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Ciclo ''Conversa ao Correr das Músicas'' 6ª CONVIDADA — VIVIANE

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Ciclo ''Conversa ao Correr das Músicas'' 6ª CONVIDADA — VIVIANE

A  sessão de gravação ao vivo do Ciclo "Conversa ao Correr das Músicas" teve como convidada Viviane Parra. A mediação da conversa musicada esteve, como habitualmente, a cargo da investigadora Soraia Simões. 

6ª Sessão/Gravação 

21 de Maio de 2015
convidada: Viviane 
acompanha de Tó Viegas
coordenação, condução: Soraia Simões
Fotografias: Alexandre Nobre
Imagem vídeo: Marta Reis 
Som: Soraia Simões 
Parceria: Associação Mural Sonoro, Museu da Música 

6ª Sessão/Gravação 
convidada: Viviane 
acompanha de Tó Viegas
coordenação, condução: Soraia Simões
Fotografias: Helena Silva
Imagem vídeo: Marta Reis 
Som: Soraia Simões 
Parceria: Associação Mural Sonoro, Museu da Música



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6 de Junho, «LER História»/Feira do Livro de Lisboa:  «A Música Popular em Portugal no contexto das Campanhas de Dinamização Cultural e no PREC»

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6 de Junho, «LER História»/Feira do Livro de Lisboa: «A Música Popular em Portugal no contexto das Campanhas de Dinamização Cultural e no PREC»

LISBOA
FEIRA DO LIVRO
APRESENTAÇÃO E DEBATE
6 de Junho de 2015
19h00

Uma iniciativa que decorreu na Feira do Livro de Lisboa
 
Foi apresentado o nº67 da revista Ler História dedicado ao tema das transformações culturais no pós 25 de Abril.
 
A apresentação da revista esteve a cargo da Professora Fátima de Sá (uma das editoras da revista LER História) e do Investigador Frédéric Vidal (editor da revista LER História, Investigador CRIA/ISCTE) e foi seguida por um debate sobre o tema "Música e Revolução. A Música Popular em Portugal no contexto das Campanhas de Dinamização Cultural e no PREC" com os intervenientes Carlos Guerreiro (Gaiteiros de Lisboa) e Manuel Rocha (Brigada Victor Jara, Direcção do Conservatório de Música de Coimbra) e a coordenação e organização de Soraia Simões (Investigadora IHC FCSH, Autora Mural Sonoro), Manuel Rocha (Músico, Professor, Director Conservatório de Música de Coimbra), Carlos Guerreiro (Músico, Professor, Gaiteiros de Lisboa)

Som: Cláudia Henriques
Edição: Soraia Simões
Fotografias: Alexandre Nobre

© 2015 Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Revista «Ler História», Letra Livre, Feira do Livro de Lisboa'15, Associação Mural Sonoro, Projecto Memórias da Revolução/IHC - FCSH («Os Sons da Revolução»)
no-re-use, free access

 

Mais informações no site do IHC - FCSH, aqui
*A segunda sessão deste ciclo realizar-se-á depois do dia 15 de Setembro, em data específica a anunciar durante esse mês e contará com José Mário Branco no painel.

A partir do mês de Junho (retomando em Setembro). As sessões, com vários intervenientes e músicos convidados, ocorrerão na Feira do livro de Lisboa, livraria Ler Devagar, FCSH, etc.
 

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«Memórias da Revolução» Os actores da música e cultura populares entre 1961 e 1975: Manuel Rocha, entrevista de Soraia Simões

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«Memórias da Revolução» Os actores da música e cultura populares entre 1961 e 1975: Manuel Rocha, entrevista de Soraia Simões

publicado originalmente aqui: Memórias da Revolução, Os Sons da Revolução, Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa

Os instrumentos de transição da cultura popular na sociedade moderna, o modo como ela interage com a história e como os actores da canção popular se apropriam dela, tornam-na não só um veiculo veloz de transmissão cultural na sociedade como de integração de códigos, valores e simbolismos nela expressos, que de outro modo dificilmente chegariam a tanta gente. Determinados aspectos e significados, como elementos iconográficos, modos de trabalho, rezas, dizeres ou provérbios que enformam determinada cultura num determinado tempo e espaço estabelecem, tendo como canal as canções, uma ligação ao padrão de vida da comunidade, seja ele laboral, social, sentimental, político, religioso ou ideológico. A melodia e a palavra em si mesma permitem que os aspectos que enformam a vida das comunidades numa determinada fase se modelem dentro de critérios específicos, seleccionados pelos protagonistas da canção e que, dado a essa plasticidade, acompanhem quer o uso que é feito das canções como a apropriação colectiva e/ou disseminação da mensagem nelas contida naquele período. O modo como a música popular foi ganhando expressão no sistema e na sociedade portuguesas está indelevelmente marcado não só pela mudança do regime político em Abril de 1974 como pelas consequências que a reforma da democracia e o processo histórico que se seguiu provocaram em todos os sectores da vida em sociedade

Aquele período de cerca de oito meses e meio, em 1975, que ficou conhecido como Processo Revolucionário em Curso (PREC) é dos períodos mais conturbados politicamente, mas também dos mais interessantes do ponto de vista cultural e no que diz respeito à volubilidade do papel e condição dos músicos em Portugal e das canções que assinalaram o mesmo.

O surgimento de cooperativas e grupos de acção cultural neste contexto [3] intensifica o poder de contestação dos cidadãos [4]. A música que se reclamava de «comprometida com uma realidade social», engajada e actuante tem neste tempo o seu palco privilegiado

Escolhi três partes de conversas que mantive com os músicos, autores e compositores José Mário Branco, Luís Cilia e Manuel Rocha, por um lado por se tratarem, no caso dos dois primeiros, de protagonistas da canção popular que surgem no mesmo período com percursos distintos, como, no caso do terceiro, por se inserir num domínio etário e contexto socio-político que vem na esteira do anterior embora comungue na discussão das mesmas linhas temáticas em que a canção popular se inscreve, mas também pelo facto de nelas perfilarem, socorrendo-se das suas vivências e da sua memória não só descritiva como da interpretativa, na medida em que há nestes diálogos uma conjunta análise das suas memórias, as suas opções até hoje, fortemente influenciadas por aquilo que experienciaram nos campos socio-culturais em que se envolveram.

 

Manuel Rocha (MR): O contexto em que eu comecei a estudar música era um contexto completamente desinserido da prática musical. Era o contexto dos chamados conservatórios, que é um contexto cheio de laçarotes mas de nenhuma humanidade e portanto a música era música completamente despida de qualquer prazer, de qualquer gosto por aquilo que se estava a fazer. Eu acabei por gostar de música mais através da música popular, sendo que aprendi as técnicas da música mais ou menos no conservatório e depois passei para o convívio com a música popular, que era ''música saborosa'' e só mais tarde, depois de ir para a União Soviética estudar, é que eu comecei a perceber que as duas coisas eram a mesma coisa, porque na União Soviética existia um sistema de ensino muito ligado, por causa da sua influência marxista em termos de concepção, ou melhor professava a ideia de que a música é sempre um objecto de circulação. Não se pode pensar em Tchaikovsky sem pensar nas melodias populares, não se pode pensar em Bach, não se pode pensar em Bartók, não se pode pensar em nada fora das músicas populares. Se nós analisarmos a obra de Beethoven, se nós analisarmos a obra de Mozart, todas elas estão influenciadas por música popular. ''Música popular'' em que sentido? No sentido de que toda a cultura, toda a ''cultura do povo'', e muitas vezes do ''povo rural'' acaba por obter cristalizações e formas estéticas que são formas estéticas que aproveitam a quem vive no meio da gente e não há ninguém que não viva no meio da gente, pode viver esquecido da gente, mas no meio da gente anda de certeza.

Pensar nos sons despidos dos homens que lhes dão sentido é uma estupidez como outra qualquer, desde logo na concepção. Nós temos uma escala, que é uma escala cromática de doze meios tons que é uma criação da humanidade, isto não foi criado por nenhuma natureza. Nós temos um sistema modal que é criação da humanidade, se nós formos para o Vietname eles lá tinham outro sistema musical, tinham outro sistema modal. Nós temos um sistema modal, que no fundo é um produto da civilização que temos. Nós temos inclusivamente na música popular muitas formas que não respeitam aquilo que é a música ocidental. Por exemplo, o maior e o menor, o maior e o menor é definido por um terceiro grau, chamado «terceiro grau», que estabelece com o primeiro grau de uma escala uma terceira menor ou uma terceira maior, em muita da música de Trás-os-Montes esse terceiro grau não é definido, e não é definido de propósito, isto é oscilação que ele tem, que se nós dividissemos um tom e um meio tom, um tom tem dois meios tons e digamos que o meio tom é a medida mínima que nós temos em música dita assim cerebralmente, no entanto essa terceira de que eu estava a falar nunca é definida, nunca é definida de propósito porque há uma ambiguidade harmónica na música antiga, nessa música popular, que é um rasto de uma civilização a que nós fomos beber presentemente e pensar na música como algo que é uma aprendizagem técnica é despido daquilo que a música tem.

Soraia Simões (MS): Achas que a visão que tu comportas desses dois universos que não são dissociáveis é uma visão contra-corrente no seio do ensino no Conservatório?

MR: É, é uma visão contra-corrente. Repara que nós tivemos no século XX alguns grandes avanços. Nós já considerámos o jazz uma música menor, uma música popular dos negros da América, no entanto ele foi sacado para a vivência por homens lúcidos que eram grandes compositores. Stravinsky tinha uma grande admiração pelo jazz, o Tchaikovsky tem um «Jazz Suite», não é?, Ravel tem numa sonata de violino um blues. Se nós virmos bem há um toque dos dois universos que é permanente e de facto pensarmos nas coisas como a dissociação completa delas é uma tolice a um nível mais elevado de que nós estamos a falar, que é ao nível da concepção musical, que é ao nível da produção musical, que é ao nível da música que circula entre as pessoas, porque a música é uma coisa que  circula entre as pessoas, é evidente que há muita música que não circula entre as pessoas, circula nas periferias e muito cerebralmente, tem tendência a morrer como tudo o que não é necessário. A humanidade é extremamente cruel para com as coisas que não são necessárias.

MS: Se calhar sempre tiveste essa linha de entendimento a respeito da música.

MR: Sim

MS: Mas, foi isso por exemplo, reportando-nos lá atrás, que fez com que tu tivesses feito parte do Movimento Alfa em torno das campanhas de alfabetização?

MR: O Movimento Alfa foi importante, porque eu na altura, quando fiz parte do Movimento Alfa, tinha 14 anos. Estavamos no PREC, estavamos no final do PREC, em que Portugal foi assolado por um conjunto muito grande de sons, entre os quais os ''sons do povo'', e em Malpica do Tejo (Castelo Branco), foi onde estive no Movimento Alfa, ainda se cantava as canções da ceifa, as canções das colheitas, ainda havia alguma ligação à terra, na altura nós trabalhavamos para comer, numa cooperativa, a Cooperativa Camponês Livre, nas terras da família Garrett, na altura ocupadas e depois devolvidas pelos governos de direita que vieram a seguir, de direita que eram do PS por acaso mas eram os governos de direita (risos), de forma que esse contacto com a música popular e com a música de que as pessoas gostavam e que viviam de uma forma mais ou menos informal dá-me ideia que isso também me formou ao nível do gosto musical e sobretudo ao nível da atitude perante a música.

Vi um paradoxo durante alguns tempos feito por alguns grupos que eram os grupos da música popular, sobretudo aqueles movimentos que levaram a música popular a todo o lado, que era porem velhos tocadores, velhos porque eram homens velhos, a falarem para uma plateia sobre a sua imensa sabedoria, estupidez absoluta. Esses velhos tocadores não eram conferencistas, não têm nada para dizer a ninguém, eles expressam-se através da música e têm uma herança musical que não é necessariamente reflectida, é uma herança musical reflectida por eles mas não reflectida no sentido intelectual do termo, ela tem tudo a ver com a função, tem tudo a ver com o balanço que se dava para dançar por exemplo se eles eram músicos de baile, tem tudo a ver com a respiração dos instrumentos, mas isso é uma apreciação estética, é uma apreciação estética muito mais importante do que a explicação da coisa em si.

Uma vez em Trás-os-Montes num trabalho que eu fiz há uns anos, estavamos a falar sobre o ensino da gaita de foles, e um velho que não me lembro agora o nome dizia-me assim: ''ó amigo, a gaita de foles não se ensina aprende-se''. Isso tem muita graça, isto é uma grande lição, é dizer que só toca gaita de foles quem ouve os velhos e depois a transforma com o seu próprio gosto.

MS: Reportando-nos agora às recolhas etnográficas, às recolhas do Giacometti por exemplo, elas ganham, quanto a ti, um interesse diferente porque a academia as valoriza dessa forma?

MR: Mas, as recolhas do Giacometti, mesmo a interpretação do trabalho do Giacometti não é livre de discussão, há quem valorize o trabalho do Giacometti e há quem não valorize nada o trabalho do Giacometti. Espero não estar a cometer nenhum sacrilégio, mas a academia desvaloriza muito o método de campo do Giacometti, eu considero que o Giacometti teve relativamente à academia uma grande importância, ele era orelhas, não era necessariamente interpretação, ele não interpretava, 'orelhava', e levava, e transmitia, mostrava e estudava às vezes com o Lopes-Graça, mas aquilo que ele fazia não era de facto isso, o que ele fazia era ir buscar, munindo-se de uma qualidade humana muito grande e de uma intenção, que era uma intenção política de alguma forma, que era uma intenção de valorizar a 'música do povo', numa altura em que a 'música do povo' estava a desaparecer. Portanto, desinserir essa música do seu meio, que é o meio da sua produção e da sua existência, é um excercício que dá para doutoramentos mas não dá realmente para mais nada, porque aquilo que fazem os grupos da música popular, como a Brigada Victor Jara e mesmo o GAC, etc é provavelmente muito mais importante do que o trabalho académico.

MS: Era isso que eu também te ia perguntar, é que se calhar isto já aconteceu de alguma forma, a valorização e discussão dessas recolhas ao longo da história com os grupos musicais, com os intérpretes.

MR: Sim, mas hás-de ver que me mesmo assim (hoje já não é esse o caminho em que estamos), no início aquilo que se pretendia era vestir de novas roupagens a música popular para lhe dar uma ideia boa para a sociedade em geral, era uma ideia paternalista. Era vesti-la de urbanidade...

MS: Mas, a Brigada (Brigada Victor Jara) [18]  fez isso no início de certa forma?

MR: A Brigada de alguma forma no início fez isso. Aliás, a Brigada tinha consciência disso. No primeiro texto que é o texto do «Eito Fora» quem o escreveu foi o Seabra [19]. Ele diz que tirar a música do seu meio próprio despe-a daquilo que é a sua essência, portanto para a trazer para o palco é necessário trazê-la de uma outra forma, da forma em que ela saiba ser lida por quem a toca, e foi isso que a Brigada fez, mas há música que não resiste a isso, as cantigas do bombo ali da Beira Baixa não resistem a isso por exemplo, não resistem nem se deixam amordaçar por isso. Nós podemos amordaçar uma música de embalar numa grande roupagem musical, mas onde ela subsiste importante é na sua função, que é de embalar os meninos, retira-la de embalar os meninos já é outra coisa.

MS: Ou como uma cantiga de trabalho.

MR: É outro objecto, é apenas transformar o objecto, mas como te digo a Brigada não terá tido nunca uma visão paternalista, mas essa visão paternalista existiu, de que a ''música do povo'' é uma música bárbara e portanto vamos meter-lhe um laçarote para que ela fique boazinha, não é? Do mesmo modo, dá-me a ideia de que o meio académico vai para o campo com o paternalismo tentar explicar.

MS: À procura de uma «autenticidade» qualquer.

MR: Exacto. À procura de uma autenticidade qualquer que depois não consegue perceber, porque depois vai para o campo e chega ao campo e apercebe-se que as pessoas lá não gostam das músicas, gostam é da «música pimba» e depois há aqui uma inquietação, que é a inquietação que nós devíamos de facto ver.

MS: Tu com a Brigada Victor Jara sempre tiveram muitos concertos pelo arquipélago dos Açores e mantem-se essa relação, a tua actividade como sindicalista e a tua actividade política também tem sido uma constante e não se dissocia da tua actividade no campo musical...

MR: Sem dúvida que não, porque é um facto que as ideias que eu perfilho que são as ideias de fraternidade, ideias da valorização do povo e dos trabalhadores e dos seus contextos culturais e dos seus contextos funcionais são indissociáveis (pausa). Não é por acaso que a cultura popular sempre foi de esquerda, de esquerda assumida como lado humanista da nossa sociedade avesso às elites que não sejam as elites do pensamento.

MS: Não activista, humanista?

 

MR: Activista mas humanista, porque nós acabamos por herdar também um legado, que é o legado da revolução francesa e que antes disso dir-se-ia do comunismo primitivo, em que os homens funcionavam com regras de compensação mútua. O gordo podia levar às costas o magro que subia à árvore para ir buscar a maçã, nunca o contrário.

Referências bibliográficas

[18] A Brigada Victor Jara foi criada no ano de 1975 por um grupo de jovens de Coimbra. Passou por várias formações até hoje. No início do seu percurso os seus integrantes reproduziam canções portuguesas e estrangeiras de pendor revolucionário com que participavam nas campanhas de dinamização cultural do MFA. Assim designados em memória do cantor chileno com o mesmo nome, morto pelos militares após o golpe de Pinochet, no Chile. 

[19] No ano de 1977 o grupo Brigada Victor Jara edita o fonograma Eito Fora - Cantares Regionais registando uma nova fase inspirada na música de cariz regional no contexto da música e cultura populares de matriz urbana. Deste agrupamento faziam parte Né Ladeiras, Jorge Seabra, José Maria Vaz de Almeida, Fernando Amilcar, Jorge Santos, João Ferreira e Joaquim Caixeiro.

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Fazer a Banda Passar, opinião por Raquel Varela

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Fazer a Banda Passar, opinião por Raquel Varela

 

por Raquel Varela [1]

Fazer a Banda passar

 

Existem neste país centenas, não sei se milhares, de Bandas Filarmónicas. 

Esta é uma consideração de teor meramente pessoal e afectivo.

Tenho vários familiares numa das Bandas Filarmónicas deste país, e elas são um  espaço que me encanta. É dos espaços de integração colectiva cultural mais emocionantes a que tenho assistido. As Bandas são espaços em que se aprende música a sério desde muito jovem.  Uma das imagens que reservo com mais nitidez na minha memória é a do espírito de entre-ajuda entre todos, quando vão para fora carregam os instrumentos juntos, é muito interclassista - desde operários manuais a doutorados -, inter-racial, na Banda há de toda a gente. O mais pequeno com oito anos e o mais velho setenta e oito.

Pagamos entre dois euros e cinco euros para se ser sócio por mês. A Banda dá vida aos locais, entendo-o como um espaço de cultura que não anula nem é concorrencial aos conservatórios e à aprendizagem de música profissional, que também é urgente que seja financiada ao abrigo dos impostos que nós pagamos.  Quanto a mim, são espaços de uma grande beleza e de uma grande vida em determinadas regiões e ainda há muitas espalhadas pelo país.

Ao contrário do que as pessoas preconceituosamente possam pensar não existem só para tocar os típicos repertórios das marchas militares ou em contextos religiosos.

Normalmente, salvo pontuais excepções, são dirigidos em situações de voluntariado o que lhes imprime, de igual modo, um espírito de solidariedade no incentivo à prática musical e artística que hoje se tem, dado a actual conjectura, perdido.

[1] para citar esta opinião: Varela, Raquel «Fazer a Banda passar» opinião, plataforma Mural Sonoro https://www.muralsonoro.com/recepcao, 12 de Maio de 2015.

Créditos:

Fotografia da autora: Tiago Gaspar

Fotografia de capa: Soraia Simões

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Francisco Rebelo (músico, produtor, técnico. Cool Hipnoise, Space Boys, Orelha Negra)

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Francisco Rebelo (músico, produtor, técnico. Cool Hipnoise, Space Boys, Orelha Negra)

103ª Recolha de Entrevista

Quota MS_00086 Europeana Sounds

 

Nota: mais em Dossier RAProduções de Memória, Cultura Popular e Sociedade
 

BI: Francisco Rebelo é um músico, produtor, técnico de som e formador português, nascido no ano de 1963, que conta já com cerca de duas décadas de actividade na Música Popular que tem sido produzida em Portugal.
Ajudou a fundar agrupamentos de forte impacto na cultura popular, nomeadamente da cidade de Lisboa, durante os anos de 1990 como Cool Hipnoise, colaborou com um conjunto de outros músicos que faziam parte da etiqueta pela qual se estreou na edição discográfica, a Norte Sul, integrou  grupos como Space Boys, Cacique 97, ajudou a criar o projecto Orelha Negra e faz parte do colectivo Cais do Sodré Funk Connection.

Nesta recolha de entrevista maior, da qual se disponibiliza uma parte no acervo online deste projecto, além de exprimir o modo como se dá  a sua ligação ao instrumento que ainda hoje diz sentir que toca com maior desenvoltura, o baixo, explica de que modo apreende o alcance que granjeou com o grupo Cool Hipnoise e o que a passagem pelo grupo lhe trouxe do ponto de vista musical como intérprete, como se começa a interessar pela utilização do som, a produção sonora e musical de forma autodidacta, atitude que aliás pontua o seu percurso nestes cerca de vinte anos quer como intérprete quer como técnico apesar de ter passado de igual modo pelo Hot Clube de Portugal, e como acaba a dar aulas partilhando as experiências que foi adquirindo do ponto de vista musical e sonoro. A introdução de mecânicas de aprendizagem da música e do som, especialmente num contexto performativo,  junto de adolescentes em bairros periféricos de Lisboa, trabalho que tem com a Associação Sons da Lusofonia, criada por Carlos Martins, as conclusões que daí advêm, como o facto das realidades (comparativamente com o tempo em que se iniciou) se terem, na sua perspectiva, alterado e hoje para muitos jovens ser mais fácil a utilização do computador para criarem as suas músicas do que aprender a tocar um instrumento musical, o advento de novos dispositivos de armazenamento, reprodução e divulgação da música que se faz, e o estúdio visto como outro instrumento musical são alguns dos aspectos aflorados por Francisco Rebelo neste registo.

© 2015 Francisco Rebelo à conversa com Soraia Simões, Perspectivas e Reflexões no Campo
Pesquisa, Som, Edição, Texto: Soraia Simões
Fotografias: Helena Silva
Recolha efectuada no estúdio de Francisco Rebelo

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Mural Sonoro no Europeana Sounds

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Mural Sonoro no Europeana Sounds

O  Mural Sonoro  faz agora parte do Europeana Sounds, na British Library, e sediado, em Portugal, no Instituto de História Contemporânea da FCSH/UNL. São sons de todos os géneros – musicais, dialectos, memórias orais ou simplesmente sons da natureza –, e de várias latitudes geográficas e culturais, que passam agora a contar com o vasto acervo do Mural Sonoro.

Parcerias:

The British Library – Reino Unido
Stichting Nederlands Instituut Voor Beeld en Geluid - Holanda
Stichting Nederland Kennisland - Holanda
Stichting Europeana - Holanda
National Technical University of Athens – Grécia
Bibliothèque nationale de France - França
AIT Austrian Institute of Technology Gmbh – Áustria
Net7 Srl - Itália
We Are What We Do Community Interest Company – Reino Unido
Centre National de la Recherche Scientifique - França
UAB DIZI - Lituânia
Deutsche Nationalbibliothek – Alemanha
Music Library of Greece - Grécia
Istituto Centrale per il Catalogo Unico delle Biblioteche - Itália
Irish Traditional Music Archive – Irlanda
Max Planck Gesellschaft Zur Foerderung der Wissenschaften E.V. – Holanda
National Library of Latvia - Letónia
Technisches Museum Wien mit Osterreichischer – Áustria
Rundfunk Berlin-Brandenburg - Alemanha
Sabhal Mor Ostaig – Reino Unido
Statsbiblioteket – Dinamarca
Oesterreichische Nationalbibliothek – Áustria
Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade NOVA de Lisboa – Portugal
Comhaltas Ceoltoiri Eireann – Irlanda

Data de início:

Fev 2014

Data de fim :

Jan 2017

Duração:

3 anos

Resumo:

O projecto Europeana Sounds foi lançado no dia 1 de Fevereiro de 2014. Este projecto de três anos, co-financiado pela Comissão Europeia, dará acesso, até Janeiro de 2017, a uma massa crítica de conteúdos sonoros digitais. Mais de 540 000 registos em alta definição serão disponibilizados online através da Europeana, da música clássica e tradicional aos sons do mundo natural e ainda a memória oral.

Coordenado pela British Library, o projecto reúne como parceiros 24 bibliotecas nacionais, instituições ligadas ao som, centros de investigação e Universidades, distribuídos por 12 países europeus.

Os conteúdos seleccionados no âmbito deste projecto ilustram a riqueza e variedade do património sonoro europeu: performances de música clássica e contemporânea cujo atractivo é intemporal e universal; música e contos tradicionais; efeitos sonoros, ambientes sonoros e sons da natureza; línguas, pronúncias, dialectos e memórias orais. Estas recolhas reflectem a diversidade de culturas, histórias e línguas e a criatividade dos povos europeus ao longo dos últimos 130 anos.

O Europeana Sounds alargará o acesso a um vasto conjunto de conteúdos que ilustram o papel desempenhado pelos sons na paisagem social, cultural e científica dos nossos tempos. Desde os dialectos perdidos aos sons de ambientes naturais em vias de extinção ou à música contemporânea, o Europeana Sounds aproximar-nos-á do passado recente no tempo presente, unidos em torno de um património auditivo comum. Boa parte deste património nasceu na era dos direitos de autor e a sua preservação para as gerações futuras deverá avançar no sentido do livre acesso a materiais ainda protegidos por direitos. Estes sons formam um novo campo da nossa cultura partilhada e o principal desafio será garantir o seu acesso ao grande público nesta era digital.

Coordenação:

Geral: Richard Ranft (British Library)
Portugal: Maria Fernanda Rollo ( Presidente Instituto de História Contemporânea - Faculdade de Ciências Socais e Humanas/Universidade Nova de Lisboa)

Equipa: Salwa Castelo Branco (Departamento de Ciências Musicais FCSH/UNL e Presidente do INET-md, da FCSH/UNL)
Ruy Vieira Nery (Dep. Ciências Musicais FCSH/UNL e Fundação Calouste Gulbenkian)
Ana Paula Guimarães (Presidente IELT - FCSH/UNL)
Maria Inês Queiroz (IHC-FCSH/UNL)

*Nota: o violino presente na imagem de capa deste texto pertence ao músico espanhol César Carazo e foi tirada por Helena Silva durante a sessão do ciclo Conversa ao Correr das Músicas no Museu da Música.

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Pedro Ayres Magalhães (músico, compositor, produtor. Heróis do Mar, Madredeus, Resistência)

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Pedro Ayres Magalhães (músico, compositor, produtor. Heróis do Mar, Madredeus, Resistência)

102ª Recolha de Entrevista  

Only with permission

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Guitarrista, compositor e produtor português nascido no ano de 1950 com um longo percurso no seio da Música Popular que é feita em Portugal nas últimas quatro décadas.

Foi um dos fundadores dos agrupamentos  Heróis do Mar [1]  e Madredeus [2] mas antes passaria por grupos no domínio do «rock» como Faíscas ou Corpo Diplomático, produziu, entre outros,  "Dar e Receber" de António Variações, colaborou com o grupo Tantra e juntou-se a um conjunto de músicos de outros grupos para formar o projecto Resistência.

Nesta recolha de entrevista, da qual se disponibiliza como habitualmente apenas uma parte no acervo deste projecto online, entre um conjunto de outros aspectos, conta como onde e porquê começou por tocar baixo, da aprendizagem autodidacta que foi assumindo com a guitarra clássica, do papel do pai nesse processo, mas expressa também as condições que foi tendo, pelos vários grupos por onde passou para a prática musical dentro e fora (nomeadamente com o grupo Madredeus) de Portugal, do papel do estúdio de gravação na sua actividade como músico, especialmente com o grupo Heróis do Mar, da conjectura social e política, explícita pelo ambiente que se vivia, quando surge o grupo Heróis do Mar  e da não aceitação do grupo nesse quadrante, das infraestruturas existentes no Portugal dos anos de 1980 para as actuações ao vivo, da Fundação Atlântica, onde foi director musical,  etiqueta que produziria fonogramas de Anamar ou Sétima Legião, com quem chegou a tocar, e da expansão de Madredeus, sem esquecer as várias fases (em crescendo e até à saída de Teresa Salgueiro do grupo, as características da nova formação de Madredeus e a junção da Banda Cósmica, composta por um conjunto de experientes músicos)  pelas quais o grupo passou, até se destacar num contexto transfronteiriço no qual permaneceu durante cerca de duas décadas, com uma actividade frequente em palcos por todo o mundo (tocaram em cerca de quarenta países), bem como os espaços sonoros privilegiados onde tocaram e que ampliaram, um pouco por todo o mundo, a apresentação/actuação da formação acústica e repertório deste grupo. Reflecte também a sua perspectiva sobre os direitos autorais, as políticas de privacidade e utilização na internet e a «lei da cópia privada».

Além da música, e devido à sua actividade neste campo, também se salienta a sua passagem pelo cinema em A Janela (2001) – compositor, A Janela Não é a Paisagem (1997) – compositor, Lisbon Story (1994), de Wim Wenders – actor e compositor, Longe (1988) – actor e compositor, De uma Vez por Todas (1986) – actor.

Temas usados na Recolha (original de Heróis do Mar) «Fado» interpretação: Resistência, «Saudade», Heróis do Mar, Etiqueta: Polygram, 1981

2015 Perspectivas e Reflexões no Campo
Fotografias: Helena Silva
Recolha no LARGO Residências

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Soraia Simões em Discurso Directo no «Lissabon Insider»

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Soraia Simões em Discurso Directo no «Lissabon Insider»

Entrevista de Daniel Hagen, Tradução para português de Helena Perez. Integral
Public. online Website: Lissabon Insider

Lissabon Insider: Por favor fala-nos um pouco de ti. Por exemplo, como cresceste, onde e como começaste por estudar e onde vives hoje?

Soraia Simões: Nasci em Coimbra, no ano de 1976. Cresci até aos 13 anos numa zona periférica da cidade, com um avô pastor que chamava o rebanho com ocarinas e apitos que fazia e uma avó que fazia queijos frescos e os vendia, depois disso vivi na cidade de Coimbra até aos 29 anos de idade, tirando o ano 2000 em que estive uma temporada em Londres, toda a minha adolescência e início da vida adulta foi feita primeiro nos arredores de Coimbra e depois em Coimbra.

Passei por várias formações, mas a que melhor me identifica, e me fez descobrir a minha paixão, foi a pós-graduação que fiz em Estudos de Música Popular no Departamento de Ciências Musicais da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, porque despertou em mim o gosto pelo trabalho de investigação e recolha de testemunhos numa área de que gosto especialmente, pela etnografia e etnomusicologia e pelas histórias orais e contemporâneas que enformam a cultura popular em Portugal. 

Moro em Lisboa, numa área geográfica em que coexistem diferentes culturas, modos de expressão, religiões, ideologias: a Almirante Reis, mas o meu bairro, aquele onde um dia hei-de ter a minha casa com os meus livros e memórias de percurso e a minha família, é Alfama. Foi um bairro que sempre me acolheu muito bem, quando andei em trabalho de campo a entrevistar intérpretes e compositores da área do fado, mas onde também conheci aqueles que são os meus mais fiéis amigos na minha vinda de Coimbra para Lisboa.

Lissabon Insider: Como começou e o que é exactamente o «Mural Sonoro»?


Soraia Simões: O Projecto Mural Sonoro surgiu durante a frequência do curso de pós graduação em Estudos de Música Popular no Departamento de Ciências Musicais da FCSH, e a partir do ano de 2011 começou a ter por objectivo o estudo e divulgação das Práticas Musicais e Manifestações culturais locais em Portugal, as associadas à migração e as ligadas à diáspora. Em Fevereiro de 2014 foi constituída a Associação Mural Sonoro. Uma Organização sem fins lucrativos.
Ao longo do projecto fui estabelecendo diálogos entre músicos, compositores, directores musicais, pedagogos e construtores de instrumentos, através de debates, conferências e recolhas musicais com o enfoque nos campos da composição, concepção musical, pedagogia, organaria/construção de instrumentos e interpretação.
Em Agosto de 2014 este meu trabalho foi distinguido com o Prémio Megafone Sociedade Portuguesa de Autores.
Metodologicamente ele comporta o método etnográfico com a pesquisa documental, na produção bibliográfica e na constituição de um Arquivo que reúne documentos de ordem variada: entrevistas, colóquios, debates, encontros sobre Música Popular para memória presente e futura, que possa servir a aprendizagem, estudos, abordagem, nova leitura de todos os interessados. 

Lissabon Insider: Segundo eu entendi o «Mural Sonoro» é uma plataforma da música portuguesa, uma espécie de de arquivo, com diversidade cultural e musical. Como podem pessoas que não estão familiarizadas com a língua portuguesa usufruir deste projecto?

Se me perguntasses isso há uns 5 anos eu diria que num contexto transnacional o português também tem de estar presente. Porque era muito radical em relação ao modo como defendia a expressão das várias culturas e das suas línguas num contexto global. Isto é: eu vou a Inglaterra ou aos EUA ver um trabalho de alguém que gosto e tenho de falar com ele inglês, mas um inglês se interessa pelo trabalho que eu, ou outro português, cabo-verdiano, angolano, brasileiro, faz espera que ele fale a língua dele, antigamente achava isto uma imposição da cultura anglo-saxónica ou anglo-americana no resto do mundo e queria combater isso. Hoje, acho de facto que o trabalho pode perfeitamente manter as suas características expressando-se numa língua de ampla circulação no mundo. Não há como combater isso. E então, essa lacuna será colmatada no próximo ano. O Mural Sonoro terá de estar disponível em inglês também. 

Para já, o facto de eu ter sido convidada para estar como investigadora também no Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, e do projecto Mural Sonoro passar, a partir de Maio de 2015, a fazer parte do concórcio Europeana Sounds, onde as identificações alusivas às minhas recolhas de entrevistas em arquivo no Mural Sonoro, passarem a estar em inglês faz com que comecem a surgir essas transcrições deste trabalho para essa língua.

Lissabon Insider: Quais os sítios que recomendarias, uma vez que o Mural Sonoro situa o seu trabalho a partir da cidade de Lisboa, para os turistas poderem visitar? Alguns que não fossem muito comuns e que gostes.


Soraia Simões: Alguns dos meus sítios favoritos, onde passo algum tempo: o bairro de Alfama, o Museu do Fado, o Museu da Música, um sítio de amigos músicos chamado TascaBeat, a Mesa de Frades (um dos meus recantos fadistas favoritos), a Cinemateca, o jardim da Fundação Calouste Gulbenkian, uma viagem de barco ao Ginjal do outro lado do rio, o Arquivo Fotográfico que fica na Almirante Reis, a chegar ao Martim Moniz, a cafetaria da Associação Renovar a Mouraria, o Centro de Documentação e a Bibilioteca António Ramos Rosa na Cova da Moura, a livraria Ler Devagar ou um passeio de bicicleta pela Serra de Sintra. Se precisarem de uma estadia, aconselho os quartos que se podem alugar por noite da Cooperativa LARGO Residências no Intendente. 

Lissabon Insider: E há alguns sítios turísticos “highlights”, qual a tua opinião sobre isso? O que não nos aconselharias visitar.


Soraia Simões: Isso depende do gosto de cada um, a única coisa que aconselhava mesmo é mais caminhadas a pé pela cidade e menos de TUK TUks e para usarem comboio e barco em vez de carro, que só causa stress e poluição em massa.

Lissabon Insider: Fado é um dos grandes tópicos dos nossos leitores. Que recomendações darias de sítios onde ver e ouvir fado e fadistas que gostes muito?


Soraia SimõesOs sítios onde mais gosto de estar a ouvir e falar com fadistas: Tasca do Chico, Mesa de Frades, Bela Petiscos em Alfama, Maria da Mouraria (que já se chamou Casa da Severa) e que pertence ao Hélder Moutinho, na Mouraria.

Fadistas preferidos vivos tenho vários, será sempre injusto dizer um ou outro nome porque me posso esquecer de alguém. Entrevistei vários para o Mural Sonoro.

Lissabon Insider: Qual o teu sítio preferido para comer em Lisboa? 


Soraia Simões: Como não como carne há cerca de vinte anos, tenho sempre um ou dois sítios, quando não como em casa, onde gosto de ir quando posso: Paladar Zen, na Av. Barbosa du Bocage 107, os Tibetanos na Rua do Salitre ou o TAO na rua dos Correeiros. Quando como esporadicamente peixe gosto de ir ao Coura perto da Sé, quando se pode gastar um pouco mais ao Ramiro na Almirante Reis e quando tenho tempo a Almada e Setúbal comer peixe fresco e aí há um conjunto de restaurantes todos bons, é só escolher. 

Lissabon Insider: Há alguma coisa que não se deva nunca dizer a um português? No caso dos turistas quando precisam de ajuda.


Soraia Simões: Acho que não. Tudo é possível, cada português é um português.

Lissabon Insider: O que esperas para o futuro de Portugal, quais os teus desejos, e para a cidade de Lisboa nomeadamente.


Soraia SimõesPara Portugal uma melhor distribuição da riqueza existente e um acabar com esta espécie de regime feudalista, para Lisboa em particular uma franca melhoria ao nível da distribuição dos apoios para a cultura e para o incentivo de tarefas necessárias ao desenvolvimento e contextualização do património existente, mas especialmente uma melhor e maior abertura para a questão da higiene nas ruas e o incentivo das ciclovias.

Lissabon Insider: Conseguirias descrever Lisboa numa palavra ou ideia apenas? Se isso é possível.


Soraia Simões: Para mim é muito fácil: o meu amor à primeira vista.

Publicação Original:  Lissabon Insider

Fotografia: Alexandre Nobre

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Associação Mural Sonoro Festival Inovação e Criatividade (FIL)

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Associação Mural Sonoro Festival Inovação e Criatividade (FIL)

 

Nos dias 23 e 24 de Abril a Associação Mural Sonoro esteve presente na FIL a convite do Festival IN - Inovação & Criatividade.

Num Festival que é já referência ibérica ao nível das Redes Empresariais, Inovação, Cidades Criativas, Negócio e Cultura,  Criatividade e Desenvolvimento, a Associação Mural Sonoro foi este ano convidada pela organização a apresentar-se, nos seus propósitos, projectos e metas, quer no espaço expositor, quer sob a forma de apresentação formal.

A apresentação da Associação e da sua dinâmica, esteve a cargo de Soraia Simões - investigadora e presidente da Associação no auditório do pavilhão dois.

Fotografias de Carlos Gomes


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«Memórias da Revolução». Os actores da música e cultura populares entre 1961 e 1975: José Mário Branco, por Soraia Simões

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«Memórias da Revolução». Os actores da música e cultura populares entre 1961 e 1975: José Mário Branco, por Soraia Simões

 SONS DA REVOLUÇÃO

Projecto do Instituto de História Contemporânea em parceria com a RTP 

Este artigo divide-se em duas partes. Na primeira parte pretende expor algumas das perspectivas, bem como as letras de algumas canções realizadas por protagonistas da cultura e sociedade portuguesas no período que vai desde a guerra colonial até ao PREC, comportando nele os anos imediatamente a seguir ao PREC. Propõe a reflexão de um conjunto de acontecimentos que marcaram o momento que precedeu e acompanhou o processo revolucionário em curso, assim como os efeitos desse processo na vida cultural desses agentes. Tem como fontes os discursos recolhidos em suporte sonoro digital no decorrer do meu trabalho de campo durante três anos (entre Agosto de 2012 e Fevereiro de 2015) a um conjunto de protagonistas vivos da música e da sociedade portuguesas neste período. 

Pretende descrever e interpretar, através das conversas mantidas com estes informantes, verdadeira memória viva, uma parte deste extenso processo, que inicia com a sua ligação à cultura, à política e à sociedade no período colonial, no contexto do seu exílio político, no PREC e no pós PREC já em Portugal 


Transcrição de parte da entrevista a José Mário Branco

José Mário Branco (JMB): A primeira infância foi numa aldeia de pescadores, perto do Porto, que hoje é uma cidade grande, que é Leça da Palmeira. Vim para o Porto já adolescente.

Soraia Simões de Andrade (SSA): É? Porque os teus pais davam lá aulas?

JMB: Eram professores primários em Leça. Aí fiz a escola primária, frequentei os primeiros anos do liceu vindo todos os dias ao Porto para as aulas e só aos 11 ou aos 12 anos é que passei a residir na cidade do Porto.

SSA: Recordas algum momento de infância em que a música estivesse presente?

JMB: Sempre esteve. Desde que me lembro. O meu pai era um amante da música, pelo facto de ter feito todo o curso do seminário e desde que eu me lembro ensinava-nos a cantar e punha-nos a cantar a vozes (pausa). Eu, aos meus dois irmãos e ele fazia os baixos e nós fazíamos as outras três vozes e muito pequenino pôs-nos a estudar piano com uma senhora lá de Leça da Palmeira, que era professora de piano. Havia uma paixão grande pelo violino da minha parte. Depois, como nós não tínhamos dinheiro, foram os meus padrinhos, pessoas abastadas da cidade do Porto que me compraram o violino e me pagaram aulas no Conservatório com um professor que era um excelente violinista, primeiro violino da Sinfónica do Porto, e também liderava o Quarteto de Cordas, era francês, e que deu cabo da minha paixão pelo violino em poucos meses, porque eu ia aos sábados de manhã, que não havia liceu, ao Conservatório ter aulas particulares de violino e a única coisa que ele me ensinava era a pegar no violino e no arco com proibição de produzir qualquer som, e eu ficava ali uma hora de pé numa sala, com o professor à minha frente, a puxar-me pelo cotovelo e a corrigir-me os dedos no arco, pousar o arco nas cordas, mas proibido de tocar, primeiro ano era só para aprender a pegar no violino e isso matou definitivamente a paixão que eu tinha pelo violino, foi um assassinato.

SSA: Um bocado como o solfejo no piano, não é? Que as crianças desistem logo.

JMB: Também, também, também...o solfejo no piano. Depois destes incidentes a música ficou um bocado posta de lado e começou uma paixão grande pela poesia, mas que é retomada quando abre a Escola Parnaso no Porto, já eu tenho 15 ou 16 anos e então com o Jorge Constante Pereira, o Ricardo Sousa Lima, a Nina Constante Pereira que era minha namorada, etc há um grupo de amigos que entra ao mesmo tempo para a Escola Parnaso e realmente isso é que me marcou para sempre. O contacto com as músicas contemporâneas, a música dodecafónica, a música concreta, música electrónica, etc. e o contacto em paralelo com a Etnomusicologia, através do Luís Monteiro, que eram aulas, aulas não, eram encontros apaixonantes.

Ao mesmo tempo de análise etnográfica, análise musical, análise linguística, etc. Chegando perto da fase em que eu ia ser defrontado com a Guerra Colonial começa em 1961, mas mesmo antes disso a partir de 1958, que é a eleição do Delgado, há uma politização através do exemplo de amigos mais velhos que já andavam na universidade, o movimento estudantil universitário, e eu fico ligado ao primeiro grupo que no Porto tenta formar associações de estudantes nos liceus, chamava-se Pró Associação. Se nas universidades, nas três universidades que existiam: Porto, Coimbra e Lisboa, as associações de estudantes eram toleradas no liceal eram mesmo proibidas.

SSA: Portanto, estávamos mesmo no início da década...

JMB: 1959, 1960, 1961. A Guerra começa em 1961. Somos um grupo de jovens, rapazes e raparigas, por um lado muito sensibilizados para as questões políticas, políticas quer dizer: para a resistência à ditadura, resistência à censura, eu costumo dizer que era uma época em que era tudo a preto e branco, porque o inimigo era facilmente identificável e todos os dias a toda a hora tu eras levado no liceu, no café, em qualquer encontro de amigos eras levado a ter que tomar decisões que implicavam um risco: arriscar a liberdade, arriscar a vida, arriscar a carreira neste caso de estudante, etc. E por outro lado uma ligação também desse grupo à poesia e à música no estilo da tertúlia, no contacto com poetas mais velhos, aquele grupo de poetas neo-realistas do Porto, a Brigitte Gonçalves, o (António) Rebordão Navarro, o Eugénio de Andrade evidentemente, o António Reis que depois foi também cineasta, etc. Começámos todos a escrever poemas, esse pequeno grupo também participou no suplemento juvenil do Diário de Lisboa que era orientado por dois escritores, um casal de esquerda, nós mandávamos artigos, mandávamos poemas, mandávamos desenhos, aqueles como os da Manuela Bacelar que hoje é uma pintora reconhecida, críticas. Esse suplemento foi proibido  pela censura e passou a ser publicado no jornal República. Também fazíamos outra coisa, é que através de familiares e da nossa própria forma de movimentação havia relações com a Academia de Amadores de Música e o seu coro, dirigido pelo Lopes-Graça, com o próprio Lopes-Graça. 

Eu assisti à chegada, em casa da Ilse Losa porque um dos membros deste grupo de jovens era a Margarida Losa, filha da Ilse e do Arménio Losa, do Graça entusiasmadíssimo com o primeiro disco prova de fábrica da «Antologia de Trás-Os-Montes», do Giacometti seleccionada por ele, «Ouçam isto, ouçam isto, isto é espantoso» e o gesto  do Graça de colocar o disco prova no toca-discos e da gente ouvir aquilo com as lágrimas nos olhos e pensarmos: como é que é possível nós termos estes tesouros no nosso país e ninguém os conhecer?

SSA: Portanto, foi ali que começaste a rever um Portugal musical...

JMB: Já eu tinha tido um tirocínio de etnomusicologia com o Luís Monteiro na Parnaso...

SSA: Pois. Ali talvez um Portugal mais rural e interior que não chegava tanto à metrópole.

JMB: Sim. E nós próprios tínhamos por hábito, sobretudo nas férias da Páscoa, de irmos em grupo percorrer por exemplo as terras do Alto Minho a pé ou depois numa segunda fase vir para o Alentejo, virmos do Porto para o Alentejo, para a aldeia de Peroguarda, que é ali no meio do triângulo Beja-Ferreira-Cuba, onde nós vínhamos, alguns de nós - os primeiros a virem foram presos pela PIDE, porque era esquisito um grupo de jovens no meio dos alentejanos, de repente: «a fazer o quê, para quê?», a gente vinha só para os ouvir cantar e falar. Eram todos comunistas claro. Baixo- Alentejo, muito muito pobres. É um bocadinho daí também que depois mais tarde vem a relação especial do Michel Giacometti com a aldeia de Peroguarda, acho que é onde ele quis ser sepultado, não é?

SSA: Sim.

JMB: E com a Virgínia, uma camponesa poetisa...Ainda conheci pessoalmente o António Joaquim Lança, o pastor-poeta. Portanto, havia esse caldo de cultura. Não se pode esquecer que é uma época em que se dá o Concílio Vaticano II, em que se dá a Revolução Cubana, em que se dá a Guerra na Argélia, tudo isso eram temas das nossas discussões, das nossas conversas. E sobretudo em 1961, eu tenho 19 anos, a partir de 1961 a questão da guerra colonial e o facto de muitos de nós estarmos ligados ao partido comunista, que era a única organização onde a gente podia fazer qualquer coisa a sério correndo todos os riscos inerentes, que no meu caso por exemplo levou à prisão pela PIDE em 1962, não é? A discussão sobre ir ou não ir participar na guerra colonial.

SSA: Acabaste por ir contra a tua vontade para França, acabaste por ser empurrado a isso.

JMB: Eu, como militante do partido comunista português, recebi a directiva de ir para a guerra, porque era a linha do partido na altura, achando que era na frente de guerra que o militante comunista poderia fazer o seu trabalho. Nenhum de nós acreditava, ou muito poucos de nós acreditavam, que isso fosse possível à luz de muitos  relatos e discussões  que vinham dos franceses, da Guerra da Argélia, onde a  posição do partido comunista francês foi exactamente a mesma e portanto havia contacto com discussões com intelectuais franceses, do movimento estudantil francês, que vieram moldar a nossa própria discussão e levar a que uma grande parte de nós seguisse a linha de recusar participar na guerra colonial e alguns não. É por isso, que depois de já ter estado preso pela PIDE em 1962, em 1963, poucos dias antes de receber o  postal de mobilização para a tropa, eu decidi aproveitar os dias que me restavam de validade de um antigo passaporte para fugir do país. E depois foram os treze anos de vida em Paris.

SSA: Voltaste em Abril de 1974, em plena...

JMB: Em 30 de Abril de 74. 

 

[6] Vou andando por terras de França

pela viela da esperança

sempre de mudança

tirando o meu salário

Enquanto o fidalgo enche a pança

o Zé Povinho não descansa

Há sempre uma França

Brasil do operário

Não foi por vontade nem por gosto

que deixei a minha terra

Entre a uva e o mosto

fica sempre tudo neste pé

Vamos indo por terras de França

nossa miragem de abastança

sempre de mudança

roendo a nossa grade

Quando vai o gado prà matança

ao cabo da boa-esperança

Bolas prà bonança

e viva a tempestade

Não foi por vontade nem por gosto …

Vamos indo por terras de França

com a pobreza na lembrança

sempre de mudança

com olhos espantados

Canta o galo e a governança

a tesourinha e a finança

e os cães de faiança

ladrando a finados

Não foi por vontade nem por gosto …

Vamos indo por terras de França

trocando a sorte pela chança

sempre de mudança

suando o pé de meia

Com a alocação e a segurança

com sindicato e com vacança

Há sempre uma França

Numa folha de peia

Não foi por vontade nem por gosto

JMB: É em França que, por um lado num primeiro período a minha única actividade para além da sobrevivência é participar em lutas políticas, em grupos políticos, cujo objectivo era ao mesmo tempo a discussão sobre o que fazer em relação a Portugal: luta armada ou não luta armada contra a ditadura portuguesa, conflito da União Soviética, tomar partido pela China ou partido pela União Soviética, e a questão da divulgação e da denúncia da ditadura portuguesa e da guerra colonial pela europa fora. Isto é preciso ser situado porque foi um movimento muito grande, muito extenso. No princípio dos anos 70, cerca de dez anos depois, Paris era a segunda cidade de Portugal, tinha mais habitantes portugueses na região parisiense. Só em França éramos oitenta mil desertores e refractários para um país de nove/dez milhões de habitantes. 

SSA: E viviam em comunidade?

JMB: Bem, isso provocou uma mudança muito importante no comportamento geral da emigração portuguesa, porque a emigração portuguesa em França, mas não só, também na Alemanha, na Suíça, no Benelux, na Inglaterra, nos países escandinavos, que fora até aí uma emigração quase exclusivamente da pobreza, uma emigração económica, com a ida de dezenas de  dezenas e milhares de jovens universitários contra a guerra mudou, porque esses jovens começaram-se a integrar nas associações, que até aí serviam só para o rancho folclórico, para o pastel de bacalhau, para o copo de tinto ou para a missa, e deu-se uma politização não de todas mas de grande parte das associações de emigrantes portugueses. Aqueles que como nós a partir de certa altura, este plural é eu, o Luís Cilia que também vivia em Paris, o Tino Flores que também vivia em Paris, o Sérgio (Godinho) que começou a viver em Paris a partir de 1967 que cantávamos canções ou que denunciavam ou que abriam novas fronteiras, digamos assim, para a comunidade não tínhamos descanso. Andávamos sempre a cantar pela Europa toda, a Europa do norte sobretudo, sempre a cantar para associações. O disco «A Ronda do Soldadinho»[7]  é resultado disso, foi um disco feito propositadamente na ilegalidade, aproveitou da experiência que eu tinha ganho já a produzir discos, a arranjar, a fazer colaborações, etc.  e foi financiado com pré-compras do movimento associativo.

1.

Um e dois e três

Era uma vez

Um soldadinho

De chumbo não era

Como era

O soldadinho

 

Um menino lindo

Que nasceu

Num roseiral

O menino lindo

Não nasceu

P'ra fazer mal

 

Menino cresceu

Já foi à escola

De sacola

Um e dois e três

Já sabe ler

Sabe contar

 

Menino cresceu

Já aprendeu

A trabalhar

Vai gado guardar

Já vai lavrar

E semear

 

2.

Um e dois e três

Era uma vez

Um soldadinho

De chumbo não era

Como era

O soldadinho

 

Menino cresceu

Mas não colheu

De semear

Os senhores da terra

O mandam p'rà guerra

Morrer ou matar

 

Os senhores da guerra

Não matam

Mandam matar

Os senhores da guerra

Não morrem

Mandam morrer

 

A guerra é p'ra quem

Nunca aprendeu

A semear

É p'ra quem só quer

Mandar matar

Para roubar

 

3.

Um e dois e três

Era uma vez

Um soldadinho

De chumbo não era

Como era

O soldadinho

 

Dancemos meninos

A roda

No roseiral

Que os meninos lindos

Não nascem

P'ra fazer mal

 

Soldadinho lindo

Era o rei

Da nossa terra

Fugiu para França

P'ra não ir

Morrer na guerra

 

Soldadinho lindo

Era o rei

Da nossa terra

Fugiu para França

P'ra não ir

Matar na guerra

JMB: Como eu não tinha dinheiro para fazer o disco e a canção era uma canção que  se tinha tornado muito popular no seio da emigração portuguesa e não só, no meio da esquerda francesa, etc, dos que eram mais sensíveis aos nossos problemas, eu contactei-os e disse: «há este disco para fazer, era importante fazer este disco, vocês acham?» e eles: «achamos», «então, quantos exemplares é que querem comprar? E confiam-me o dinheiro antes de ver os discos ou não?». E, portanto, eu recebi dinheiro de compras antecipadas de exemplares do disco e foi com esse dinheiro que o disco foi feito. Tudo isto numa escala muito pequena.

SSA: A canção a esta altura era mesmo vista como uma arma ou era mais uma resposta ao que se estava a passar?

JMB: Sim sim sim. Mas, não fomos nós que inventámos. Já era em Portugal. Nas manifestações reprimidas de estudantes, nos plenários do movimento estudantil universitário, nas greves, etc., que se faziam em Portugal em condições de repressão muito dura, cantava-se sempre. Ou as canções heróicasdo Graça ou...

SSA: As que vieram a servir depois às campanhas de sensibilização do MFA? 

JMB: O «Canta Camarada Canta» [8] que foi uma canção quase emblemática da resistência anti-fascista em Portugal é uma cantiga de contrabandistas que foi recuperada pelo coro da Academia e depois recuperada pelo movimento estudantil universitário. Pronto. E em França é este percurso que se faz e é a partir do momento que há um estraçalhamento destas estruturas políticas de extrema-esquerda, a partir de 65, e pelo facto de um primo da minha mulher se esquecer ou deixar uma viola no nosso apartamento por onde passou em Paris que eu comecei a ter contacto com esse instrumento que eu nem conhecia. Eu tocava piano, tocava percussões, tocava flauta de bísel.

SSA: Acordeão também já tocavas...

JMB: Acordeon sim, porque tem um teclado, o acordeão de botões eu não sei tocar. 

O que se chamou na altura o ''movimento dos baladeiros''. O Zeca Afonso, o Adriano (Correia de Oliveira) e outros. Comecei a querer cantar as cantigas dos outros, eu também já gostava muito de outros géneros de canções: da canção poética francesa, canções brasileiras, canções anglo-saxónicas algumas. De forma autodidáctica comecei a pegar na viola, que tive de encordoar que até lhe faltavam cordas, e de ouvido a aprender a acompanhar-me a cantar canções, e é a partir daí que ponho a hipótese de me exprimir através desse meio.

SSA: E achas que contribuíste para largar essa conotação um bocado até pejorativa do ''baladeiro''?

JMB: Mais tarde, sim, mais tarde. Isso foi uma grande discussão, que nos levaria a horas de conversa.

SSA: Porque este termo ''o baladeiro'' surge sobretudo no meio comunicacional e social...

JMB: Sim. E sobretudo associado a uma grande pobreza musical das canções.

SSA: Aquelas pessoas que se faziam acompanhar de uma viola, sabiam dois ou três acordes...

JMB: Que sabiam três acordes, que faziam tudo igual e muitas das vezes contra a própria mensagem da poesia. Exclude disto completamente o Zeca Afonso, porque o Zeca Afonso era um caso absolutamente à parte, e que continua a ser, de grande riqueza poética e musical e sobretudo interpretativa, mas o que veio na esteira do Zeca foi esse ''movimento dos baladeiros'' que até leva depois o Raul Solnado a fazer um sketch a ridicularizá-los, não é? Mas, há excepções. A «Pedra Filosofal» do Manuel Freire [9]  é uma cantiga que foi uma viragem histórica pelas circunstâncias em que foi conhecida e que tem, digamos, qualidade poética e musical. 

SSA: Mas tu achas que essa expressão também tinha a ver com um certo movimento que se estava a criar na cabeça dos meios comunicacionais em Portugal de uma música engajada e de uma certa 'militância'?

JMB: A influência mais importante que havia em Portugal do estrangeiro era a francesa. Mesmo a palavra engajada vem do francês engagée que era o adjectivo aplicado à maior parte da canção poética francesa do pós-guerra, digamos essencialmente dos anos 50. Os meus pais, éramos pequeninos, davam-nos a ouvir George Brassens.

SSA: Leó Ferre muito provavelmente mais tarde.

JMB: Não. Não chegávamos tão longe, mas como eu trabalhei na rádio nesse período ainda antes de ir para França, nesse período mais agitado da minha juventude (eu trabalhei na rádio por causa da Parnaso) eu tinha contacto com muitas canções, com muita música que se fazia, que se tocava nas rádios. Essa postura da canção comprometida com uma realidade social penso que vem em primeiro lugar a partir da influência dos franceses, antes da canção brasileira sobretudo Dorival Caymmi, e mais tarde, só mais tarde, vem do lado anglo-saxónico de um certo ressurgimento da canção política italiana, porque também foi um país onde houve guerra e houve resistência.

SSA: Mas, também era o que passava nas rádios nessa altura?

JMB: Os estrangeiros passavam por vezes. Eu fiz o possível quando trabalhei na rádio para passar essas coisas. Até cantigas da guerra de Espanha eu passava. 

SSA: Em 1974 quando regressas a Portugal fundas o Grupo de Acção Cultural Vozes na Luta, com o qual ainda gravas dois fonogramas...

JMB: Gravámos uma primeira série de singles e Eps que depois foram reunidos num LP chamado «A Cantiga é uma Arma»[10] e participei no seguinte que é o «Pois Canté!»[11].

SSA: Qual era a relação da música que tu fazias com a indústria desta época? Era ou não muito expressiva a indústria nesta época?

JMB: Bem, com a experiência que eu trazia do disco «A Ronda do Soldadinho» e a radicalidade que enformava a própria existência do GAC, o GAC não nasce digamos por uma iluminação repentina no 25 de Abril, em Paris no ano anterior ao 25 de Abril já estava em gestação um grupo cuja ideia era precisamente isso: fazer música, e não só música, proibida, música ilegal, música de resistência, música subterrânea. Eu tinha tido uma cooperativa em que participei com amigos franceses chamada Organum já mais experiências de auto-edição de coisas marginais, completamente marginais, e que eram financiadas fora do sistema. E portanto, esse colectivo que estava em gestação em Paris, quando se dá o 25 de Abril, chamava-se Colectivo de Acção Cultural, estava o Luís Martins Saraiva, estavam uma série de pessoas que em Paris assumiam uma atitude mais ou menos parecida com a minha, que era de ruptura com o sistema. E portanto quando se chega a Portugal e o GAC depois ganha a configuração que ganha, primeiro foi uma grande misturada, nem se chamava Vozes na Luta era só Grupo de Acção Cultural, e depois esse grupo mais ou menos amorfo dividiu-se em vários, mais ou menos em função das diferenças políticas que haviam na esquerda portuguesa. Há uns que foram para o PC e fizeram um grupinho ligado ao PC, outros que eram da LUAR e fizeram um grupinho ligado à LUAR, para onde foi o Zeca Afonso e o Sérgio (Godinho), etc. Nesse primeiro GAC digamos que claramente maoista, e definido como de extrema-esquerda maoista.

SSA: Onde tu também estavas.

JMB: Ao princípio só estive eu. Dos conhecidos, só estive eu, o Fausto, o Tino Flores e depois todos aqueles jovens que vieram do coro da juventude musical e do instituto gregoriano que foram uma nova geração, alguns deles estão hoje nos Gaiteiros (de Lisboa): o Rui Vaz, o Carlos Guerreiro e o Pedro Casaes, pelo menos esses. Mas, era sobretudo o Luís Pedro Faro e as pessoas deste tipo que vieram dar solidez artística e uma nova energia aquele grupo de ''pós-baladeiros''.

SSA: Mas, havia rivalidades nessas várias esquerdas e isso reflectia-se também na música? 

JMB: Enormes, enormes. Isso seria outra conversa. O GAC que fica dessa discussão e dessas diferentes cisões assume a sua ligação política com a esquerda maoísta que é introduzindo o nome «Vozes na Luta», passa a ser Grupo de Acção Cultural Vozes na Luta.

SSA: «Ser Solidário», «Margem de Certa Maneira», «A Noite» e o emblemático «FMI»[12]. Muita coisa mudou, em termos territoriais, sociais, políticos, de concepção musical também.

JMB: A Margem (referindo-se ao fonograma com edição de autor, editado no ano de 1972, em França «Margem de Certa Maneira») é Paris ainda. Depois entrei para a Comuna (Teatro A Comuna) em 77 ou 78, já não sei, para fazer A Mãe que também dá origem a um LP e depois, em fim de Janeiro de 79, há uma cisão na Comuna, a Manuela (referindo-se à sua companheira Manuela de Freitas, letrista e actriz), eu e outros formámos um novo grupo que se chama Teatro do Mundo e é já no contexto do trabalho no Teatro do Mundo que eu começo a produzir uma série de canções que vêm a dar o projecto «Ser Solidário». O «Ser Solidário» foi recusado por todas as editoras, na maioria dos casos por eu querer incluir o FMI, ficaram todos assustados, o Tozé Brito por exemplo respondeu-me por escrito que já lá tinham um Sérgio Godinho na Polygram e que era a mesma coisa. Mas, foi recusado por todas as editoras. Valentim de Carvalho, Polygram, a que depois se chamou Sony, todas. 

O grupo Teatro do Mundo decidiu levar à cena o concerto «Ser Solidário» e diz-se mais uma vez a mesma coisa: convidei o público a pré-financiar a existência do disco. Foi assim que o disco foi feito. Ele tem uma etiqueta comercial (Edisom), porque entretanto surgiu essa nova editora, que era do Zé da Ponte e do Guilherme Inês, que aceitou editar o disco e fazer ao lado um maxi-single do «FMI», mas já estava tudo gravado e pago. Os concertos foram em 80 e  81, sempre esgotados. Acabou por sair em 82 o disco.

SSA: A maneira que tu tinhas de ser fiel às tuas convicções no fundo era nunca ceder à indústria?

JMB: Era. E as pessoas assinavam um talão, davam quinhentos escudos, eu ficava com o nome e a morada e depois com a promessa de que quando saísse o disco eles recebiam o disco em casa. 

SSA: Achas que foi isto que fez também com que tu sempre estivesses tão próximo do público? O facto de não haver uma barreira ali da indústria?

JMB: Talvez. Em 85 com «A Noite» acontece exactamente a mesma coisa. 

SSA: Aquilo está cheio não é? Aquilo é gravado ao vivo e pelo menos no áudio parece que está muita gente ali.

JMB: Está está. Aí foi com talões publicados nos jornais. Sempre esgotado. Duas épocas de um mês cada uma. Em Outubro e Novembro de 1980 e em Maio de 81. Sempre esgotado. E depois, quando sai o disco em 82, acho que também em Maio, foi na Aula Magna esgotada também para entregar os discos às pessoas. 

Realmente, criou uma almofada de público para este tipo de canções, que está muito a cavalo entre esse fenómeno de que tu falas digamos que da marginalidade de certos cantores, e depois o outro fenómeno que é uma coisa muito forte que ficou do PREC, que é: a identificação política, não é? Estes são os nossos cantores. E isso é que me fez dizer alguma vez: nós éramos aqueles a quem a esquerda chamou «os nossos» e depois da derrota da esquerda a direita chamou «os deles». Por isso a partir do refluxo da revolução em 76, 77, 78, nós fomos totalmente cortados dos meios de comunicação, abolidos, não havia rádio nem televisão para nenhum de nós. A única maneira era ir ter com as pessoas e fazer concertos. 

Referências bibliográficas

[1] Recolha de entrevista de Soraia Simões de Andrade a José Mário Branco foi reublicada no projecto liderado pela The British Library com a Quota MS_00029 Europeana Sounds, do minuto 7 ao minuto 40 do áudio disponibilizado no Portal Mural Sonoro, área «História Oral». Fonogramas gravados com ed.de autor e/ou financiados em pré-compra pelo público: Ronda do Soldadinho (Single, Ed. Autor, 1969) Single; Margem de certa maneira (LP, Guilda da Música, 1973) LP/CD; A Mãe (LP, 1978) LP; Ser solidário (2LP, Edisom, 1982); FMI (Maxi, Edisom, 1982); A Noite (LP, UPAV, 1985)

[2] Luís Cilia foi o primeiro cantor que no exílio denunciou a guerra colonial e a falta de liberdade em Portugal. A sua actividade constante, a partir de 1964, tanto discográfica como no que diz respeito à realização de recitais, fê-lo profissionalizar-se em 1967. Durante vários anos dedicou-se ao estudo de harmonia e composição. Recolha de entrevista de Soraia Simões de Andrade a Luís Cilia realizada em Agosto de 2013. Disponível com a Quota MS_00041 Europeana Sounds. Disponível no Portal Mural Sonoro, área «História Oral». Fonogramas gravados com ed.de autor durante o exílio em Paris: 1964 -"Portugal-Angola: Chants de Lutte" (França); 1965 -"Portugal Resiste" (França e Itália); 1967 -"La Poésie Portugaise de nos jours et de toujours" nº1 (França e Espanha (1968); 1967 -“O Salto” (França); 1969 -"La Poésie Portugaise de nos jours et de toujours" nº2 (França e Espanha (1973); 1971 -"La Poésie Portugaise de nos jours et de toujours" nº3 (França); 1973 -"Contra a ideia da violência a violência da ideia"   (França, Portugal (1974) e Espanha (1975); 1973 -“Meu País”  (França e Portugal(1974) reedição melhorada do  LP  “Portugal, Angola - Chants de Lutte”; 1974 -"O guerrilheiro"  (Portugal); 1974 -“O povo unido jamais será vencido” (Portugal - duas edições distintas); 1975 -"Resposta"  (Portugal e França); 1976 -"Memória"   (Portugal, Espanha, RDA , Itália e Bulgária); 1981 -"Marginal" (Portugal); 1982 -"Cancioneiro"  (Portugal) reedição de “O guerrilheiro”, com regravação de voz

[6] Margem de Certa Maneira, Mês e Ano de edição: Dezembro de 1972, Edição de autor, José Mário Branco.

[7]  A Ronda do Soldadinho, Edição de Autor, 1969, José Mário Branco.

[9]  «Pedra Filosofal», Música: Manuel Freire, Letra: António Gedeão

[10]   «A Cantiga é uma Arma», 1975, compilação dos quatro primeiros singles, Grupo de Acção Cultural - Vozes na Luta (GAC) 1974 - 1978.

[11]  «Pois Canté!», 1976, canções compostas maioritariamente por José Mário Branco e João Lóio, tendo como referência/suporte instrumentação de cariz tradicional como adufes e bombos, mas onde estão presentes de igual modo instrumentos de cariz clássico como oboés e violinos. Os poemas são de cariz intervencionista e é um dos fonogramas que mais marca este colectivo.

[12]  Fonogramas da autoria de José Mário Branco que marcam distintas fases do percurso do músico e compositor.

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Michales Loukovikas (músico, jornalista e compositor grego)

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Michales Loukovikas (músico, jornalista e compositor grego)

101ª Recolha de Entrevista
Quota MS_00084 Europeana Sounds

 

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[esta recolha de entrevista foi realizada em inglês] 

Há cerca de quatro anos conheceu Amélia Muge  (escutar 55ª recolha de entrevista neste acervo) e juntos criaram, produziram e interpretaram, com um conjunto de outros músicos, o fonograma, editado no ano de 2012, Périplus.

Nesta recolha de entrevista, da qual se disponibiliza uma parte neste trabalho online, entre outros aspectos, o músico e autor grego, conhecedor da música que é feita na Grécia - ocidental e oriental, clássica e folclórica - explica de que modo as traduções são importantes no conhecimento da história da cultura e dos repertórios de cada país, do que representou para si trabalhar com músicos portugueses, das proximidades entre alguma da música popular que se faz na Grécia com a que é feita em Portugal, do papel oferecido pela internet na descoberta, criação e recriação conjunta, mas de igual forma de que modo o advento destas plataformas diminui a capacidade do músico, tanto na Grécia como em Portugal, em viver da música que faz. 

A relevância do som, das linguagens tanto sonoras como literárias, musicais e  político-sociais para «criar coisas novas» são características que aflora ao longo do seu depoimento.

O fonograma Périplus - Deambulações Luso-Gregas, resultado desta união, apela a uma viagem em torno sobretudo da costa do mediterrâneo, em que os gregos são a cabeça e os portugueses a extremidade cultural, onde  se reúnem mares e continentes distintos, música e poesia. Com este trabalho discográfico o músico actuou em palcos como o da Culturgest, o do Centro Cultural Vila Flor e o do Festival Músicas do Mundo em Sines, onde se fizeram, ele e Amélia Muge, acompanhar de Filipe Raposo ou Miguel Tapadas (piano), Harris Lambrakis ou Nikos Paraoulakis (ney, flauta de bisel), Kyriakos Gouventas ou Manuel Maio (violino e bandolim), Manos Achalinotópoulos (clarinete folk), António Quintino (contrabaixo), José Salgueiro (percussão), Ricardo Parreira (guitarra portuguesa), Catarina Anacleto (violoncelo) e o coro Outra Voz. 


2015 Perspectivas e Reflexões no Campo


Recolha realizada no Instituto de História Contemporânea, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (IHC - FCSH/UNL)

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Guida de Palma (intérprete, compositora, professora de canto)

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Guida de Palma (intérprete, compositora, professora de canto)

100ª Recolha de Entrevista
Quota MS_00083 Europeana Sounds

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BI: Guida de Palma nasceu em Setúbal no ano de 1962. É uma intérprete, autora, compositora e professora de canto que conta já com um vasto percurso em domínios diversos da Música Popular.

Nesta recolha de entrevista maior, da qual se disponibiliza uma parte neste acervo online, expressa as suas primeiras experiências musicais em coros ainda em Setúbal (Coral Luísa Todi, onde interpretava um repertório folclórico e erudito), o papel do seu pai na sua infância (com os discos que tinha em casa e reproduzia. Sobretudo vozes americanas no domínio da «soul music») a sua ida para França para estudar literatura e o modo como paulatinamente vai experienciando a sua actividade na música, na dança, na produção, emprestando a sua interpretação vocal em anúncios de publicidade ou em espectáculos que congregavam a interpretação e a dança, especialmente em Paris. Muda-se mais tarde para Inglaterra onde vive 17 anos exclusivamente da música e onde adquire um conjunto de outros contactos com diversos autores e músicos com os quais passa a colaborar dentro de formas musicais distintas da cultura popular. Estudou também Engenharia de Som e reflecte sobre as várias valências que foi, por necessidade de conhecimento mas também para enriquecimento da sua actividade (indo ao encontro daquilo que necessitava), acrescentando ao seu caminho profissional.

Os seus públicos foram durante um tempo vital sobretudo franceses e ingleses, quando regressa a Portugal a ligação com o circuito onde se fez como intérprete e compositora mantém-se e também por isso expressa neste registo algumas das principais diferenças que sente entre estes vários circuitos europeus e o modo como as possibilidades para a música e os músicos se apresentarem acontece, bem como a sua visão sobre assuntos actuais como os novos dispositivos de armazenamento e partilha de conteúdos sonoro-musicais online, a lei da cópia privada ou o Sindicato dos Músicos.

No seu legado fonográfico contam-se, entre outros: Guida De Palma & Jazzinho - Atlas, Veludo ‎(LP, Album, 180), diversos singles e eps como: Dançar Cantar ‎(12"), Eurobond Records 1990, Dodge City Productions Featuring Ghida De Palma* - As Long As We're Around 3 versions 4th & Broadway 1992, Nova Fronteira Featuring Guida De Palma - Supernova / Calma ‎(12") Z Records ZEDD, Boriqua Bandits Feat. Guida De Palma - Midnight Expresso 2 versions Recordings 2002, Nathan Haines Feat Guida De Palma - O Misterio ‎(12") Chillifunk Records 2004, Boriqua Bandits Feat. Guida De Palma - Midnite Expresso: The Remix ‎(12") 2004, Guida De Palma & Jazzinho - The Lagoon Monster ‎(12") Freestyle Records (2) 2006, Guida De Palma & Jazzinho - Abraco Da Bossa (Incognito Lounge Mix) / A Seed In You ‎(7") Expansion 2014, A Certain Pleasure Featuring Ghida De Palma* - Be There ‎(12"), Boriqua Bandits Feat. Guida De Palma - Midnight Expresso 2 versions Recordings 2002, Nathan Haines Feat Guida De Palma - O Misterio ‎(12"), Chillifunk Records 2004, Boriqua Bandits Feat. Guida De Palma - Midnite Expresso: The Remix ‎(12"), Recordings 2004, Guida De Palma & Jazzinho - The Lagoon Monster ‎(12") Freestyle Records (2) 2006, Guida De Palma & Jazzinho - Abraco Da Bossa (Incognito Lounge Mix) / A Seed In You ‎(7") Expansion 2014 ou A Certain Pleasure Featuring Ghida De Palma* - Be There ‎(12") 2 Groove Records.

© 2015 Guida de Palma à conversa com Soraia Simões, Perspectivas e Reflexões no Campo
Pesquisa, Som, Edição, Texto: Soraia Simões
Fotografias: Helena Silva
Recolha efectuada em LARGO Residências

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Saltério

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Saltério

O saltério  é da família dos cordofones. Trazido pelos árabes, é um dos instrumentos de cordas mais importantes durante a idade média trovadoresca, aparecendo inúmeras vezes representado na iconografia e referido em fontes escritas ele vai sendo desenvolvido e evoluindo até ao renascimento acabando por dar origem aos instrumentos de teclas da família do cravo.
Nas práticas musicais no contexto da cultura popular em Portugal  não sobrevive nenhum instrumento desta família, ao contrário de outros países do continente europeu. Em Portugal o apreço, como já referido nesta área do Portal, recai sobretudo sobre as violas típicas de várias regiões do país.
Assemelhando-se a uma harpa, o saltério é um instrumento de cordas geralmente pulsadas ou beliscadas, como esta. A sua origem é longínqua. Remonta pelo menos a 300 a.C., quando era utilizado no domínio religioso para acompanhar os salmos.
No século XII este instrumento é composto por uma caixa de ressonância triangular ou trapezoidal integrando de sete a dez cordas que se beliscam - daí a sua denominação que designava, na Grécia Antiga, todos os instrumentos tocados com os dedos e não com o plectro [1] .
Na caixa de ressonância encontramos de sete a dez cordas fixas através de cavilhas. A caixa de ressonância tem normalmente a  forma de um trapézio, dois ordenamentos de cordas em correspondência dos lados oblíquos, cordas essas que se encontram distantes umas das outras, de modo a poderem ser beliscadas com os dedos, ou então percutidas com plectros ou com uma vara em metal ou madeira, criando ou uma melodia ou um acompanhamento rítmico. 


Este instrumento musical tem algumas variantes e o facto de ter um tamanho pequeno tornou-o funcional e fácil de transportar e hoje ainda é usado, sobretudo no continente europeu, para acompanhar o canto.
Enquanto que o saltério de arco é em geral em forma de triângulo e as cordas encontram-se mais próximas e sobre o mesmo plano, no caso do saltério ibérico, as cordas podiam ser pulsadas com os dedos ou percutidas com martelos.

A difusão deste cordofone pela Península Ibérica é ilustrada por obras portuguesas e espanholas para saltério, tanto na música erudita como na música popular. Em peças religiosas e operísticas, destaca-se a sua utilização feita por compositores como Francisco António de Almeida (Te Deum, Venerandum tuum verum), António Teixeira (As guerras do alecrim e manjerona, 1737: aria Não posso, ó Sevadilha), Antonio Soler (Ciego y Lazarillo, 1762) e Blas de Laserna (Los amantes chasqueados, 1779).

Foto do músico Joaquim António Silva no túmulo de Dona Inês de Castro, mosteiro de Alcobaça


Foto do músico Joaquim António Silva no túmulo de Dona Inês de Castro, mosteiro de Alcobaça

Na noite de 12 de Março, pelas 22h, o músico e investigador espanhol Eduardo Paniagua esteve comigo à conversa na quinta sessão do ciclo "Conversa ao Correr das Músicas" acompanhado por César Carazo.
Oriundo de uma família de grande tradição musical, é irmão de Carlos Paniagua e Luis Paniagua, este último construtor de instrumentos para a própria família, mas também para músicos de repertório similar, como por exemplo Jordi Savall. Carlos Paniagua é o construtor do saltério com que Eduardo tocou alguns dos temas do seu repertório no Museu, e com o qual nos explicou também alguma da sua história como intérprete, bem como do instrumento associado aos contextos em que é tocado.

Conversa ao Correr das Músicas. Eduardo Paniagua, Museu da Música 12 de Março de 2015, fotografia Helena Silva (Associação Mural Sonoro, Direitos Reservados) Salterio construido por Carlos Paniagua em Tanger

Conversa ao Correr das Músicas. Eduardo Paniagua, Museu da Música 12 de Março de 2015, fotografia Helena Silva (Associação Mural Sonoro, Direitos Reservados) Salterio construido por Carlos Paniagua em Tanger

Na noite a seguir à conversa musicada no Museu da Música,  Eduardo Paniagua apresentou-se em Sesimbra [3]  de novo com o saltério. Desta vez no projecto «Al Mutamid, Rei Poeta do Andaluz», um projecto audiovisual que reflecte a contemporaneidade de um território cultural comum a três países: Portugal, Espanha e Marrocos. O projecto traduz-se num concerto, um CD e um filme numa concepção musical, direcção artística e realização de Carlos Gomes, com a direcção musical de Filipe Raposo e propõe celebrar a vida e obra de Al Mutamid [2]. Fazem dele parte músicos de diferentes geografias, três portugueses: Filipe Raposo (direcção musical, piano), Janita Salomé (voz e adufe), Joaquim (Quiné) Teles (percussões várias), dois espanhóis: Cesar Carazo (voz e fídula), Eduardo Paniagua (saltério) e dois marroquinos: El Arabi Serghini (voz e percussões) e Jamal Ben Allal (violino). 

Fontes bibliográficas e outras fontes
[1] peça de tamanho reduzido que servia  para percutir instrumentos de corda, o equivalente à palheta.

[2] Al Mut'amid Ibn Abbâd é considerado um um dos mais talentosos poetas ibero-árabes do séc.XI. Nasceu em Beja no ano de 1040 e foi príncipe regente em Silves, ambas as cidades hoje situadas em território português. Entre 1069 e 1090 foi rei da Taifa de Sevilha, sucedendo a Al Mutamid, seu pai. Após ter sido destronado em 1091 pela dinastia Almorávida, que passou a controlar todo o sul da Península Ibérica, foi exilado em Tânger e acabou por falecer na maior das misérias em Aghmat, 18 km a sul de Marraquexe, Marrocos, em 1095, onde passou os últimos anos da sua vida de preso e desterrado. 


[3] O espectáculo apresentado em Sesimbra, à semelhança do apresentado no ano anterior no São Luiz, mostra um repertório criado por estes músicos, oriundos destes três países, para os poemas de Al Mutamid.


- Paniagua, Eduardo à conversa com Simões, Soraia, «Ciclo Conversa ao Correr das Músicas», Museu da Música, 12 de Março de 2015, Organizado por Associação Mural Sonoro e Associação dos Amigos do Museu da Música.


- Trindade, Orlando, construtor de instrumentos de cariz medieval, ajuda na selecção de fontes de pesquisa.


-Sachs, Curt, The History of Musical Instruments, W. W. Norton & Company Inc, New York, 1940.


-Montagu, Jeremy, TheWorld of Medieval & Renaissance Musical Instruments, David & Charles, London, 1976.


-Munrow, David, Instruments of the Middle Ages and Renaissance, EMI / Oxford University Press, 1976.


-Page, Christopher, Voices & Instruments of the Middle Ages, J. M. Dent & Sons Ltd, London, 1987.


-Bernard, Nelly Van Ree, The Psaltery, Frits Knuf Publishers, 1989.


-Vários autores, Los instrumentos del Portico de la Gloria su reconstrucción y la música de su tiempo, Fundación Pedro Barrié De La Maza, La Coruña, 1993.


-Duffin, Ross W., edição, vários autores, A Performers Guide to Medieval Music, Indiana University Press, 2000.


 

 

 

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Tomás Pimentel (Músico, Compositor, Professor: trompetista)

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Tomás Pimentel (Músico, Compositor, Professor: trompetista)

99ª Recolha de Entrevista

Quota MS_00082 Europeana Sounds

 

                                                                                                                                        Only with permission

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É um músico e professor que conta já com cerca de quatro décadas de actividade.

Nasceu em Lisboa no ano de 1960 e profissionalizou-se na música tendo o trompete como instrumento, muito embora tenha, como conta nesta recolha de entrevista, começado por estudar piano.

Oriundo de uma família de músicos, depois da experiência ao piano decide-se pelo trompete e estuda Educação Musical e Composição, na Escola de Música do Conservatório Nacional em Lisboa.

No seu legado contam-se diversos fonogramas e espectáculos ao vivo em que participou, de José Afonso, Júlio Pereira, Fausto, José Mário Branco, Sérgio Godinho, bandas residentes de programas de televisão, entre um número grande de outras colaborações com músicos de vários domínios musicais. Apesar de viver exclusivamente da prática musical, quer como professor quer como músico, Tomás Pimentel tem o seu nome inscrito na história da música popular especialmente como músico integrante da formação de outros músicos de destaque, tendo até hoje gravado como solista apenas um fonograma, editado no ano de 1994.

Nesta recolha expressa a importância da linguagem musical que apreendeu, quer no Conservatório como no Hot Clube, e que lhe permitiu estar com o trompete com alguma destreza na Música Popular em vários domínios, explica a importância que as bandas filarmónicas ofereceram para vários trompetistas em Portugal, a evolução do ensino da música e como observa as dificuldades de que o ensino artístico especializado tem sido alvo especialmente nos últimos meses.

O tema usado nesta recolha de entrevista faz parte do agrupamento Septeto de Tomás Pimentel e tem o nome «Raiz». Neste tema tocam os músicos: Tomás Pmentel: Fliscorne, Jorge Reis: Saxofones Alto e Soprano, Edgar Caramelo: Saxofone Tenor,  António Pinto: Guitarras , João Paulo Esteves da Silva: Piano, Mário Franco: Contrabaixo e Alexandre Frazão: Bateria.

Perspectivas e Reflexões no Campo


Fotografias: Helena Silva
Recolha realizada em LARGO Residências

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CICLO: CONVERSA AO CORRER DAS MÚSICAS. 5º CONVIDADO — EDUARDO PANIAGUA

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CICLO: CONVERSA AO CORRER DAS MÚSICAS. 5º CONVIDADO — EDUARDO PANIAGUA

 

Excerto 5ª Sessão «Conversa ao Correr das Músicas» com Eduardo Paniagua

(1) No ''Conversa ao Correr das Músicas'', noite de 12 de Março no Museu da Música, em que estive com o músico e investigador Eduardo Paniagua, demonstrou-se que as dicotomias patenteadas ao longo dos tempos entre «baixa cultura» e «alta cultura», ''música popular contemporânea'' e ''música clássica antiga'' são sobretudo criadas no âmbito cultural para sustentar teses e/ou definições sociológicas, tecnológicas, económicas, normativas e negativas.

Já Middleton afirmava que nenhuma das teses que as colocavam em contraste eram sustentáveis, mas apenas pontos de vista de quem as vinculava. O que é isto, afinal, de uma Música que «faz parte da cultura de elites» e outra que «faz parte da cultura do povo», sendo a música dotada de uma maior compreensão quando abordada num campo cultural mais alargado, onde toda ela faz parte de uma indústria de produção e recepção?

Por outro lado, a 'complexidade' que a historiografia musical descreveu durante anos a respeito da música de tradição clássica, antiga ou erudita, a sua lógica e uso frequente de modulações, poucas repetições, a sua divisão em pequenas unidades, como períodos, movimentos ou fraseados, também pode ser encontrada em repertório dito popular no seio de tipologias musicais como o 'jazz' ou até a 'bossa nova'.
E se olharmos para este instrumento musical de nome
«saltério», que Paniagua tocou na noite de 12 de Março, ele não tem características semelhantes a outros instrumentos de corda beliscada ou pulsada tocados na cultura popular?

 

(1)  Soraia Simões, Investigadora (IHC/FCSH),  Associação Mural Sonoro (Presidente de Direcção)

(3) José Félix (Comunicação Museu da Música), prospecto relativo à sessão

(4) Fotografias de Helena Silva na sessão ocorrida no Museu da Música

Pesquisa, Som, Texto: Soraia Simões
Fotografias: Helena Silva



8.JPG

 

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(2) «Eduardo Paniagua é um dos músicos mais consolidados no contexto da música antiga e medieval. 
Oriundo de uma família de grande tradição musical, é irmão de Gregorio Paniagua e Luis Paniagua, este último construtor de instrumentos para a própria família, mas também um reputado luthier dos melhores músicos de repertório similar, como por exemplo Jordi Savall.

Organização: Associação de Amigos do Museu da Música e Associação Mural Sonoro.
€7,5
+ RESERVAS E INFO: 217710990


EDUARDO PANIAGUA nasceu em 1952 e vive em Madrid. Combina a carreira de arquitecto com a de especialista em música da Espanha medieval. 
Prémio Intérprete de Música Clássica 2009 da Academia de Música de Espanha, foi também nomeado para os prémios UFI (União Fonográfica Independente), Música Clássica em 2010, 2011 e 2012. 
Começou a gravar álbuns com apenas 16 anos. Dos 20 que gravou até 1982 com o Atrium Musicae, destacam-se "La Folia", "La Spagna", "Música da Grécia Antigua." 
É membro fundador dos grupos Cálamus e Hoquetus e especializou-se em música árabe-andaluz. 
Em 1994 criou os grupos Música Antigua e Ibn Baya, para o trabalho sobre as Cantigas de Afonso X e a Música Andaluza, respectivamente. 
Em paralelo fundou e dirige a editora Pneuma, com um total de 140 CDs editados, dos quais mais de 90 são do seu grupo musical: cantigas, trovadores, cancioneiros e música renascentista e pré barroca. 
Entre 1995 e 1999 trabalhou para a Sony Classical, coleção Hispânica.

Actualmente é o Presidente da Fundação de Música Antiga.

Pelo seu trabalho em favor da convivência de culturas recebeu, em outubro de 2004, a Medalha das quatro sinagogas sefarditas de Jerusalém. Pela divulgação destas músicas inéditas vem recebendo excelentes críticas e prémios internacionais, tendo sido nomeado em 1997, 2000 e 2004, como Melhor Artista de Música Clássica nos Prémios da Academia de Música.

Realizou 7 exposições sobre instrumentos musicais, como por exemplo "Bisabuelos de una Orquesta" e "Instrumentos de la Edad Media".
Publicou livros como "Música Europea del siglo XV para el Órgano de papel de Leonardo da Vinci", "Los Cuatro Elementos y la Sociedad Red, Música", "Rumi e Ibn Arabí, La ciencia del Amor", "Ibn Gabirol, caballero de la palabra", etc.

Actualmente, Eduardo Paniagua desenvolve, com o grupo Música Antigua, o projecto de gravação das Cantigas de Alfonso X. 
O grupo Música Antigua, liderado pelo músico, é composto por especialistas na música medieval espanhola. Integra cantores e instrumentistas espanhóis e convidados estrangeiros que se debruçam sobre projetos musicais e discográficos de três culturas que coexistem em Espanha: judaica, muçulmana e cristã. 

Os seus trabalhos sobre a música andaluza e hispano-judaica tiveram excelentes críticas internacionais e o apoio da Agência Espanhola de Cooperação Internacional, pela sua qualidade e pela recuperação do património musical hispano medieval. 
O trabalho que desenvolve com instrumentos cópia dos da época é essencial para a realização dos projetos musicais de concertos e gravações».

(2) Museu da Música, mais detalhes aqui

(3) José Félix (Comunicação Museu da Música), prospecto relativo à sessão

(4) Fotografias de Helena Silva na sessão ocorrida no Museu da Música 

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